Page 17 - Telebrasil - Março/Abril 1991
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T ecnologia:
João Carlos Pinheiro da Fonseca
O Governo Collor prometeu inse
rir o Brasil nos trilhos da econo
mia mundial e no rol dos países
desenvolvidos.
Ministro da Infra-Estrutura,
Ozires Silva, atento a um
desen volvim en to tecn ológico,
al programa envolve, porém, a ar
T ticulação de nexos filosóficos, eco do CPqD da Telebrás.
nômicos, sociais, políticos, formando
um quadro em que o avanço tecnoló
gico — ainda que importante — não
é por si só suficiente, como apurou a
R evista Telebrasil, junto à comu
nidade pensante da ciência e tecnologia.
Jacques Marcovitch, 44, professor
titular da USP e diretor do Instituto
de Estudos Avançados (IEA) recomen
da para longo prazo “o avanço do co
nhecimento tecnológico, mas em fun
ção da realidade geoeconôinica e so
cial do País e para médio prazo — vis
to que temos escassez de recursos hu
manos que levam de 20 a 30 anos pa
ra formar — que a sociedade eleja Quanto aos recursos humanos ne País. “No entanto, com o correr do
programas mobilizadores (agroindús cessários para desenvolver tecnolo tempo, as mesmas estatais se revela
tria, infra-estrutura, energia, meio am gia, ele opinou que “de nada adianta ram redutos para respaldo político, o
biente) com a participação do Estado, rá formar mais doutores, sem aprimo que aos poucos as inviabilizaram. O
da Pesquisa e do Desenvolvimento e rarmos a basti da pirâmide educacio exercício da democracia pressupõe
do setor produtivo, cada qual atuan nal, onde ocorre evasão de alunos”. partido e políticos em atividade, mas
do com capacidade complementares Mas nem tudo está perdido. No Bra sem uma visão imediatista a cada qua
e diferenciadas”. sil dual, já há empresas que se trans- tro anos, quando se sabe que a redu
nacionalizaram (autopeças, produtos ção do fosso dual de nossa sociedade,
D ualism o cítricos e avícolas, vestuário) e que através da educação e saúde, é um
competem lá fora, apesar de que na processo que poderá lever de 10 a 15
“O Brasil é um País do 3o mundo área high tec persistir o problema da anos”, fulminou o diretor do Institu
de tipo especial, com ilhas de econo assistência pós-venda, que exige per to de Estudos Avançados da USP.
mia moderna, ao lado de uma socieda manente atualização em tecnologia
de de subsistência, o que cria um fos de ponta. T ecn ologia
so interno, que cresce com o passar Tomando a microeletrônica como
do tempo. A política para o curto pra exemplo, Jacques Marcovitch explicou Em análise similar, o economista
zo deverá ser dualista, isto é, deixan que a mesma não se desenvolve em André Furtado Tosi, 36, do Depto.
do agir a mão invisível do mercado Universidades ou em empresas isola de Política Científica e Tecnológica
no setor moderno, ao lado de uma das e sim quando çla penetra o con da Unicamp, observou que o Brasil
postura intervencionista do Estado, junto da sociedade. “Uma inovação consegue competir em setores madu
dando saúde e educação para o setor precisa ser entendida por todos para ros (siderurgia, agroindústria, papel-
atrasado”, disse o pesquisador da dar certo e isto só se obtém quando celulose) graças à abundância de suas
USP, acrescentando que também cres há uma pirâmide educacional funcio matérias-primas e baixo custo de mão-
ce o fosso entre o Brasil e os países nando. Um operário só aproveitará de-obra (inclusive a especializada),
desenvolvidos, estes tirando da tecno bem os novos materiais se ele souber, mas que em setores de ponta funda
logia enorme vantagem competitiva. no mínimo, ler e escrever. Desigualda mentais — como o Complexo Eletrô
Ele alertou para o fato que a Euro des precisam ser reduzidas, primeiro, nico — sua competitividade decresce.
pa poderá, através da biogenética, vir para que a tecnologia encontre real O modelo de substituição de exporta
a competir com países, como o Bra apoio no mercado”, sintetizou o pro ções que o País adotou conduziu à di
sil, apesar das vantagens climáticas e fessor titular da USP. versificação demasiada e à falta de
territoriais destes. Neste sentido, a ro Sobre as estatais ele observou que grandeza de escala para competir no
dada uruguaia do Gatt manteve, por estas surgiram numa época em que exterior.
influência européia e para ganhar tem apenas o Estado tinha recursos sufi “Deixando de lado a pobreza, exis
po, os subsídios à agricultura. ‘‘No cientes para investir e lembrou que te aqui um mercado moderno, inter
campo internacional, o discurso libe foi o início da siderurgia estatal, nos no, da ordem de 15 milhões de pesso
ral é um e sua realização prática é ou anos 40, que viabilizou o surgimento as e dotado de um parque industrial
tra”, ironizou o cientista. de uma indústria automobilística no importante. Mas há o problema da