Page 14 - Telebrasil - Maio/Junho 1986
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Software
A luta dos "botecos” contra o MC Donald’s
dos contratos de comunicações à sua
No Brasil, por ora, há que se recorrer
A ssim como carro não anda sem aos 10 instrumentos da Lei 7232 de in averbação no INPI.
combustível, vitrola não toca sem
disco, computador não opera sem soft
formática, com sua polêmica reserva de
ware. Por isso mesmo, a discussão sobre mercado de 7 anos e aos atos normativos C ríticas
sua regulam entação empolga todos 22 (registro de software) e 23 (priori
aqueles m ais ligados à computação. dade de empresa nacional nas contrata Dentre as críticas que foram feitas à
Como, por exemplo, Carlos José Pereira ções do governo). proposta SEI/INPI, está a idéia de "soft
de Lucena, 42, da PUC-Rio de Janeiro, ware funciopalm ente é equivalente”,
com doutorado em com putação na Problem a literário um conceito de difícil aplicação prática,
UCLA, que numa promoção da SEI e sob quando um mesmo programa executa as
direção da SBC discorreu recentemente mesmas funções em ambientes opera
sobre o assunto. Bastante debatido nos círculos aca cionais diversos ou acessando base de
O ponto fundamental defendido por dêmicos, outro problema colocado por dados distintos.
Lucena é que software (ele não gosta da Lucena diz respeito ao tratam ento do — Mas a questão de fundo é definir
palavra, preferia logicial) deve ser visto software como obra literária. Na sua um regime jurídico para tratar da ques
mais como um produto tecnológico do opinião, software é um produto lógico tão (um bom tema para a Constituinte)
que um simples trabalho de produção composto também de matemática e en
intelectual, como preferem os países de genharia. A matemática entra com a de modo que qualquer implementação
senvolvidos. formalização, descaracterizando a li que atenda a uma mesma especificação
Um dos problemas existentes para teratura, e a engenharia com a tecnolo possa ser considerada como um objeto
tanto, segundo o técnico, é o de que a Lei gia de apoio e o desenvolvimento do pro diferente — aconselhou o palestrante.
da Informática (Artigo 3." III) ao definir duto, o que requer muito capital — sin Dentre os aperfeiçoamentos destina
software estabelece distinção entre pro tetizou o conferencista. dos a proposta da SEI/INPI Lucena su
gramas e sua documentação — a seu Quanto à documentação que descre geriu incluir o conceito de código aberto
ver, uma ambigüidade. Bravamente, ve o produto, hoje há tendência para ser ao usuário; am pliar a gama de distribui
ele oferece sua definição de software: parte do próprio software que se auto- dores de software; considerar a figura de
uma formalização da aplicação de uma explica. Atualmente, existem dois tipos "joint-ventures intelectuais” de consór
tecnologia produzida, eventual mente, básicos de software: aquele mais diri cios nacionais com fornecedores exter
com a assistência de métodos automati gido para o especialista de informática e nos; e definir melhor a responsabilidade
zados de tal forma que um ou mais de o mais dirigido para o usuário final. O pela manutenção e atualização dos pro
seus níveis é diretamente executável conceito do programa isolado que recebe gramas.
por computador. dados paru fornecer soluções (e que leva Enquanto não sai a lei do soãware
E o que seria programa? Esta é uma ao conceito de direito autoral) deve ser Lucena é de opinião que a SEI, para não
questão que ele mesmo responde ao di abandonado em favor do conceito de en perder tempo, deve tentar disciplinar o
zer que "programa é a especificação for genharia de produto, no qual se agre mercado com os instrumentos já a seu
mal de um algoritmo”. Segundo ele, es gam tecnologias de hardware e soft ware alcance. "A proteção do software não
tas definições favorecem a posição bra para atender a determ inada situação significa, no entanto, que o produto na
sileira, visto que algoritmos, tais como (como a automação de um banco). cional deixa de competir com o estran
fórmulas matemáticas, seriam criações geiro. Deve-se também considerar a as
intelectuais, patrimônio de humani Proposta sociação com os parceiros naturais re
dade, não sujeitas ao direito do autor. presentados pelas estrangeiras, forne
Da mesma maneira, sistemas operacio Segundo Lucena, a proposta SEI/ cedores independentes de software”, re
nais e linguagens de programação não INPI a ser enviada ao congresso trata da comendou o conferencista para quem é
precisariam ser adquiridos e poderiam comercialização de software estrangei m elhor in cen tiv ar do que proteger,
ser utilizados livremente. ro e da proteção à tecnologia nacional. ainda que esta proteção seja essencial.
Existem diversas maneiras de ver a Distingue a importação a regime fecha
proteção legal ao software como pa do (contrato de comunicação) e aberto P ergunta
tente, direito autoral, segredo indus (contrato de transferência de informa
trial e contrato. Na opinião do conferen ções) e admite o contrato de instalação Então, porque o software nacional
cista, o sistema de patente funciona de software nas dependências do usuá não deslancha? A resposta, dada por Lu
desde que o software esteja incorporado rio. A proposta prevê que a distribuição cena é a de que nosso mercado não está
ao dispositivo e que atenda ao requisito de logicial será sempre efetuada por devidam ente "arrum ado” para esti
de inovação, algo difícil de ser compro uma empresa nacional, a não ser o caso m ular o desenvolvimento nacional de
vado. Apenas um, entre dezenas de pro dos fabricantes que fornecem software programas, que nem como produtos são
gramas, está registrado no INPI. para suas próprias máquinas. O contra considerados.
A World Intellectual Property Orga- to de comunicação obrigará à aprovação Porém a melhor observação veio de
nization — WIPO, recomendou, em de um programa de capacitação e de de um distribuidor de software estrangei
março de 85, o uso do direito autoral senvolvimento tecnológico, algo que o ro, integrante da platéia:
como forma de proteção do software e conferencista acha de difícil realização — No B rasil existem centenas de
nos Estados Unidos o Copyright Act, prática. pessoas que desenvolvem programas,
versão de 1976, legislou que a proprie A dedutibilidade fiscal, a transferên mas não conseguem se juntar. É com o se
dade intelectual independe do meio que cia de recursos ao exterior e a possibili fossem uma porção de botequins inde
lhe dá suporte e protege contra reprodu dade do registro de programas junto à pendentes fazendo sanduíches para
ção, adaptação e tradução do trabalho SEI, bem como o acesso ao mercado in competir com a cadeia do Mac Donald’s
com autoria. terno, estarão condicionados, no caso (JCF) -r