Page 17 - Telebrasil - Janeiro/Fevereiro 1967
P. 17
A participação no lucro
DIGESTO ECONÔMICO - Novembro/Dezembfo, 1966
Eugênio Gudin
A questão da participação dos empre marxista da «mais-valia». Marx disse que
gados no lucro das emprésas foi objeto a mais valia se transforma em capital
de estudo e debate na Academia de Ciên Assim sendo, a reinvindicação de uma
cias Morais e Políticas de França. Ésse parte dos lucros passa, no esquema mar
debate foi provocado, de um lado, por xista, a ser um direito dos empregados já
um excelente estudo do professor Daniel que a mais valia, segundo Marx, lhes
Villey (bem conhecido no Brasil) sóbre o pertence.
Não é que todos os que propõem a re
lucro e, de outro, por uma emenda do de
putado Louis Vallon propondo a partici partição do lucro sejam marxista. Uns a
pação dos empregados «no incremento do encaram como um meio de promover a
difusão da prosperidade sob sua forma
ativo da emprésa resultante de reinvesti-
mais moderna, de valores mobiliários; ou
mento do lucro».
Villey observa que vários economistas tros a recomendam com o fito de integrar
russos que gozam do bafejo oficial cre- o operário na emprésa, tornando-o acio
descobriram as virtudes do lucro, dando- nista e assim fazendo^o participar da
gestão empresarial; outros, enfim, não es
lhe um papel de destaque no exame da
eficiência das organizações econômicas, condem o propósito de um socialismo re
com função de «indicador de gestão». Ana volucionário de implantação progressiva,
lisando percucientemente a natureza do à medida que os incrementos do ativo em
lucro, diz o ilustre professor Nances que presarial passam a ser redistribuídos.
«o moralista náo raro se esquiva de acom — X —
panhar essa análise, com receio de que No debate realizado na Academia
uma melhor compreensão do fenômeno o procurou-se examinar os argumentos re
impeça de conduzi-lo». lativos à justa atribuição e apropriação
Nas emprésas capitalistas modernas, do lucro. Um dos comentadores observou,
dos países desenvolvidos, como dos subde com justos motivos, que o lucro ou o pre
senvolvidos. uma parte considerável dos juízo de uma emprésa depende da boa ou
lucros é reinvestida. Em França estima- má administração, isto é, da capacidade
se que cêrca de metade da capitalização, do que êle chamou de Estado-Maior da
incremento do ativo, provém do «autofi- empresa.
nancraxnento», isto é, do reinvestimento Um outro registrou o fato indiscutí
do lucro. vel de que o lucro é o resultado da boa
H n princípio, o lucro deveria ser to produtividade e que essa depende, no
do êle distribuído aos acionistas, os quais mundo industrial de hoje, do áparelhamen-
decidiriam então reinvertê-lo na mesma to mecânico e do equipamento pósto à
emprésa. que o produziu ou em outras. A disposição do operário e não mais da ha
prática do autofinanciamento subtrai do bilidade e capricho do operário como acon
mercado de capitais a maior parte da tecia ao tempo do artesanato.
poupança nacional. Um terceiro apontou o modo por que
Não é fácil, porém, mesmo nos países o problema é encarado nos Estados Uni
rdiantados. encaminhar a poupança para dos, onde as emprésas se dispõem a con
ésse mercado. No caso do Brasil a falta ceder ao trabalho, isto é, ao salário, todo
de conhecimento, por parte do público, da ou quase todo o produto da melhoria da
verdadeira situação das emprésas a infla produtividade e não mais do que ésse pro
ção endêmica e a deficiente organização duto para evitar a inflação. Há vários
do mercado de capitais tomam precárias anos passados, a General Motors fazia um
as possibilidades de financiamento das em acôrdo com os sindicatos trabalhistas as
présas por subscrição direta do público. segurando-lhes um mínimo de aumento
Donde o recurso ao autofinanciamento, anual de salários de 2 1 2Çc, avaliando a
isto é, ao reinvestimento dos lucros. companhia nessa percentagem a melho
— X — ria da produtividade que podia garantir.
A sugestão de repartir os lucros com — X—
os empregados nada mais é na realidade, A confiança assim revelada por essa
do que uma aplicação do célebre princípio e outras emprésas americanas na melho-