Page 26 - Telebrasil - Setembro/Outubro 1966
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A  Estatização  da  Poupança

                                    Nacional               O  Globo   Rio   19-9-66


                                                               EUGÊNIO  GUDIN


           Quando  da  recente  visita  do  Ministro   ro  que  dêle  extraiu?  É  como  o  caso  da  ca­
       da  Fazenda  ao  Conselho  Nacional  de  Eco­  noa  que  perseguida  por  uma  baleia  foi  ali­
       nomia  formulou  o  conselheiro  José  Boni­  viando  a  carga,  jogando  sucessivamente  ac
       fácio  Coutinho  Nogueira  uma  pergunta   mar;  1)  um  banco  de  madeira;  2)  o  car­
       que  merece  ser  registrada.  Indagou  o  ilus­  regamento  de  laranjas;  3)  um  chinês;  4)
       tre  conselheiro  dos  fundamentos  por  que  o   um  judeu,  arpoada  afinal  a  baleia,  estava
       GOVÉRNO  DA  PREFERÊNCIA  A  INVES­    o  judeu  sentado  no  banco,  vendendo  as  la­
       TIMENTOS  ESTATAIS  EM  DETRIMEN­      ranjas  ao  chinês...
       TO DA  INICIATIVA PRIVADA.
                                                 Digo  que  essa  é  a  “melhor  das  hipó­
           A  pergunta  tem  inteiro  cabimento.  Os   teses”  porque  grande  parte  dos  recursos
       investimentos  só  se  fazem  com  poupança.   do  BNDE  até  agora  tem  sido  aplicada  a
       E  a  poupança  é  uma  só.  A  parte  que  o   empréstimos  às  estradas  de  ferro  federais
       Govêrno  arranca  do  Setor  Privado,  por   insolváveis  e  às  siderurgias  tècnicamente
       meio  de  impostos  taxas  e  contribuições,  re­  mal  estudadas  e  promovidas  com  critérios
       duz  proporcionalmente  a  capacidade  de  in­  estaduais,  em  vez  de  econômicos  e  na­
       vestimentos  dêsse  setor.             cionais.                       >
           Segundo  os  dados  constantes  da  ou-   O  que  só  vem  confirmar  0  fato  de  que
       blicação  “Programa  de  Investimentos  Pú­  “O  mercado”,  isto  é,  o  Setor  Privado  guia­
       blicos’,  do  Ministério  do  Planejamento,  o   do  pela  demanda  do  consumidor,  aplica
       valor  para  êste  ano  dos  investimentos  do   muito  melhor  seus  recursos  do  que  o  Es­
       Govêrno  de  autarquias  e  de  emprêsas  in­  tado.
       dustriais  e  dos  Estados  e  Municípios  as­
       cende  a  5,2  TRILHÕES  DE  CRUZEIROS.
       Seria  evidentemente  temerário  fazer  agora   Não  é  o  Estado  no  sentido  do  Govêr­
       uma  estimativa  do  Produto  Nacional  Bru­  no  de  hoje  e  sim  o  Estado  Brasileiro,  de
       to  em  1966.  Mas,  em  têrmos  de  ordem  de   um  modo  geral,  com  os  padrões  e  crité­
       grandeza,  deve  regular  por  45  trilhões.  O   rios  administrativos  correspondentes  a  nos­
       que  quer  dizer  que  os  investimentos  esta­  so  precário  estágio  de  educação  política,
       tais  correspondem  a  QUASE  12%  DO  PRO­  Estado  em  que  é  usual  a  interferência  dos
       DUTO  NACIONAL BRUTO.  E  como  o  total   fatores  políticos  e  onde  a  direção  das  em­
       da  poupança  nacional  costuma  ser  aproxi­  prêsas  é  entregue,  na  melhor  das  hipóte­
       madamente  de  16%  a  17%  dêsse  produto,   ses,  a  coronéis  honestos  mas  desprepara­
       concluiu-se  que  os  INVESTIMENTOS  DO   dos  e  onde  impera  o  desperdício  por  fôrça
       SETOR.  PÜRLTCO  REPRESENTAM  CÊRCA    mesmo  dêsse  despreparo  e  dessa  inex­
       DE  DOIS  TÊRÇOS  DO  INVESTIMENTO     periência.
       TOTAL.  Só  fica  um  têrço  para  o  Setor
       Privado.                                              —X—
           Se  isto  não  é  uma  economia  estatiza-   Alega-se  que  há  muita  emprêsa  pri­
       da,  não  sei  o  que  o  será.        vada  mal  administrada  e  de  baixa  produ­
                                              tividade.  Se  há!  Mas  de  quem  a  culpa?
                       —X—  '                 Como  conseguem  essas  emprêsas  ganhar
                                              dinheiro  nessas  condições?  Por  dois  sim­
           Por  que  cargas-d’ágüa  hão  de  se  sub­  ples  motivos:  primeiro,  pela  inflação  em
       trair  o  Setor  Privado  as  economias  com   que  a  demanda  faz  com  que  se  venda  até
       que  êle  poderia  contribuir  para  o  aumento   lixo;  segundo,  pela  muralha  chinesa  da
       da  produção  ou  a  melhoria  da  produtivi­  proteção  aduaneira,  de  100%  e  mais.
       dade,  canalizando  êsses  recursos  para  o
       Banco  de  Desenvolvimento  Econômico,  o   Acabe-se  com  a  inflação;  deixem-se  as
       qual  ”na  melhor  das  hipóteses”  passa  a   econcmias  nas  mãos  do  Setor  Privado  que
        emprestar  ao  dito  Setor  Privado  o  dinhei­  as  gerou;  limite-se  a  30%  a  proteção  adua­
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