Page 14 - Telebrasil - Novembro 1962
P. 14

CÓDIGO BRASILEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES

                                                   — “Diário de Notícias, 22-11-1962 —

                                                  Artigo assinado por
                                                  GUSTAVO CORÇAO

Tenho diante de mim o texto da com que se enfeita esta velha Repú­

lei número quatro mil cento e dezes­ blica que no outro dia fêz setenta e

sete, sancionada pelo exmo. Sr. presi­ três anos, e ainda não tomou juízo.

dente da República, e publicada no Conseguem, sem dúvida, o resultado,

«Diário Oficial», de 5 de outubro pró­ mas não creio que seja tamanha a per­

ximo passado. Trata-se do esperado, versidade de seus autores. Mais de­

ou do ameaçado «Código Brasileiro de pressa me inclino para outra hipótese:

Telecomunicações». Lí-o. Na primeira o que levou os autores do «Código»

leitura pareceu-me ruim, mas na se­ ao involuntário culto da incompetência

gunda leitura pareceu-me ainda pior. foi o sagrado horror, a repugnância

   Entre outras coisas assinalo o «Con­  cívica que êsses cavalheiros têm pela
                                         coisa chamada «emprêsa». Pior do que
selho Nacional de Telecomunicações»,
criado no capítulo IV. Terá presidente   espelunca, bordel, prostíbulo, a coisa

indicado pelo presidente da República,   chamada «Emprêsa» lança um estig­
terá conselheiros indicados pelo minis­  ma indelével sôbre seus servidores. O
                                         nacionalismo vigilante de nossos ho­
tro da Guerra, Marinha e Aeronáuti­
ca; outros indicados pelo Chefe do Es­   mens públicos não poderia, pois, con­
                                         sentir que almas assim poluídas en­
tado-Maior das Forças Armadas; ou­       trassem no santo dos santos onde o
tros indicados pelos ministros da Jus­
tiça, da Educação e Cultura, das Rela­   dedo fecundo do presidente da Repú­
ções Exteriores, da Indústria e Comér­
                                         blica, direta ou indiretamente, indica
cio; e ainda outros indicados por seme­  todos os membros.

lhantes critérios. Só não podem ser Acontece que, em regra geral, todos

conselheiros em matéria de telecomu­ os entendidos em telecomunicações tra­

nicações as pessoas sôbre as quais pe­ balham em emprêsas de telecomuni­

se a mais leve suspeita de entenderem cações, e não em emprêsas de laticí­

alguma coisa do assunto. O artigo nú­ nios, nem em consultórios de dentista

mero 23, do mesmo Capítulo IV, diz ou de psiquiatra. Sendo assim, não po­

textualmente: «Nenhum membro do deremos ter no Conselho quem enten­

Conselho ou servidor, que no mesmo da de telecomunicações. Paciência, cul-

tenha exercício, poderá fazer parte de tiva-se a incompetência, mas salvam-

qualquer emprêsa, companhia, so­ -se os grandes princípios do naciona­
ciedade ou firma, que tenha por lismo e do estatismo.

objetivo comercial a telecomunica­       O presidente já nomeado para o

ção». E aqui está, nesta singela «Conselho» declarou há dias que va­

amostra, a evidência da filosofia cilava entre instalá-lo em Brasília ou

que inspira o «Código». Será justo cha- no Rio. Tire a média, presidente, e dei-

má-la de Filosofia do Culto da Incom­ xe-o a meio caminho, e como tudo en­

petência ?Não me parece que seus au­ tre a verdadeira e a falsa capital vai

tores tenham procurado, com clara e por »via aérea, instale-o na estratosfe­

firme a intenção, mais um dêsses pri­ ra, que é onde estará posto com mais

morosos ramalhetes de incompetência propriedade.
   9   10   11   12   13   14   15   16   17   18   19