Page 5 - Telebrasil - Janeiro/Fevereiro 1991
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e d i t o r i a l







                                                                                                    A fX








                                                                                                                                                                               C u l t u r a   t e c n o l ó g i c a :











                                                                                                                                                                                 A l g o   a   s e r   p r e s e r v a d o
























                                                                                                                                                                                                    Luiz de Oliveira Machado




                                                                                                                                                                                                    (Presidente da  Telebrasil e da

                                                                                                                                                                                                    Standard Eletrônica)










                                                                                                                                                                                               Gastou-se  dinheiro  demais  ali,  segundo
                                           O            setor de telecomunicações passa por mo­                                                                                        os críticos. Esta discussão é estéril. Diferen­


                                                        mento de grande transformação, que cor­


                                           responde  às  mudanças imprimidas pelo  Go­                                                                                                 temente  de  tantos  empreendimentos  públi­


                                           verno Federal a todos os segmentos da socie­                                                                                                cos inacabados, em que se queimou o dinhei­



                                           dade brasileira. Neste cenário, era inevitável                                                                                              ro  público  a  troco  de  nada,  ali  se  produziu


                                           que  se  repensasse  a  política  de  Pesquisa  e                                                                                           um bem  de valor inestimável, que é a cultu­


                                           de Desenvolvimento Tecnológico, vale dizer,                                                                                                  ra  tecnológica,  que  dá  emprego  e  projeção



                                           reexaminar o  papel, os objetivos e a estraté­                                                                                              a alguns que  lá estão,  mas que  indiretamen­


                                           gia  do Centro  de  Pesquisa e  Desevolvimen-                                                                                                te beneficia ou beneficiárá a qualquer cidadão.


                                           to da Telebrás — o CPqD — principal execu­                                                                                                           É  gratificante  verificar  que,  15  anos  de­



                                           tor daquela política.                                                                                                                        pois daquele começo modesto,  formou-se to­


                                                    A  leitura que se  faz de  um  fato óbvio co­                                                                                       da  uma  geração  tecnologicamente  acultura-


                                           mo este pode variar muito conforme a visão                                                                                                   da em técnicas digitais, comutação, transmis­


                                           de quem o lê. Pode-se chegar a extremos, co­                                                                                                 são, componentes, satélites, comunicação de



                                           mo  imaginar que o CPqD  vai  acabar, ou  te­                                                                                                dados.  Enfim,  todo  o campo  de  telecomuni­


                                           rá  o  seu  papel  substancial mente  reduzido                                                                                               cações foi direta ou indiretamente influencia­



                                           ou  esvaziado.  Neste  ponto,  mobilizam-se  os                                                                                              do  pela  cultura  desenvolvida  a  partir  dos


                                           interesses  dos atingidos:  os empregados em                                                                                                 projetos coordenados e realizados pelo CPqD.


                                           defesa  do  emprego,  as  empresas  usuárias                                                                                                Temos hoje condição de contribuir em  foros


                                           dos  resultados  em  defesa  de  suas  posições,                                                                                             internacionais de alta tecnologia, como o ISS



                                           os  líderes dc  projetos que se tornaram auto­                                                                                               (International Switching Symposiun), os gru­


                                           maticamente preferenciais, em defesa da po­                                                                                                  pos, do CCIR e CCITT e tantos outros.



                                           sição  de  preferencialidade.  Para  quem  está                                                                                                      É inaceitável qualquer retrocesso ou esva­


                                           dentro  do  CPqD,  ou  lida  dc  perto  com  ele,                                                                                            ziamento que signifique abrir mão de um va­


                                           fica  claro  o  clima  de  crise  por  que  passa  a                                                                                         lioso mecanismo que, comprovadamente, ge­



                                           instituição.                                                                                                                                 rou  toda  uma cultura tecnológica.  Entretan­


                                                   Analisar a trajetória do CPqD desde o iní­                                                                                           to, vale ressaltar que este extraordinário bem



                                          cio  pode  trazer  um  pouco  de  bom  senso  e                                                                                               não pertence aos empregados do CPqD, nem


                                          equilíbrio  na  análise  dessa  reformulação.                                                                                                 mesmo a própria Telebrás,  mas sim é patri­



                                          Cheguei a Campinas em fins de 1976, chefian­                                                                                                  mônio da sociedade brasileira.  A comunida­


                                           do um  pequeno grupo de  menos de dez pes­                                                                                                   de  vinculada  ao  CPqD  —  interna  ou  exter­


                                          soas, com  finalidade  de  implantar o Centro.                                                                                                na  —  deve  aceitar,  portanto,  com  serenida­



                                          Quando  saí,  em  setembro  de  1979,  éramos,                                                                                                de o reexame do seu modelo, e submeter-se,


                                          no  Centro  e  em  seus  projetos  associados,                                                                                                sem  corporativismo  ou  defesa  de  interesses



                                          mais de 500.  Havia atividades em todo os se­                                                                                                 pessoais  ou  de  grupos,  aos  ajustes  necessá­


                                          tores  tecnologicamente  proprietários  e  se­                                                                                                rios,  como de  resto ocorre em  todo segmen­



                                          guia  acelerada  a  obra  de  sede  própria.  Ou­                                                                                             to  da  vida  nacional,  dentro  e  fora  do  setor


                                          tros  administradores  se  sucederam,  pessoas                                                                                                 das telecomunicações. Toda empresa e insti­



                                          entraram, outras saíram, projetos foram con­                                                                                                  tuição  passa  periodicamente  por  revisões


                                          cluídos  com  maior  ou  menor  êxito,  outros                                                                                                 de modelo ou de estratégia, sem que isto ca­



                                           foram  iniciados.  Uma história  igual a de ou­                                                                                               racterize um esvaziamento de mérito ou des­


                                          tros Centros de Pesquisa.                                                                                                                     crédito.


                                                   Retornei a Campinas no início do ano pas­                                                                                                     O CPqD teve muitos sucessos em sua tra­



                                           sado (1990),  para dirigir o Centro Tecnológi­                                                                                               jetória,  mas  isto  não  lhe  deve  dar  a  preten­


                                           co  do  Grupo  Standard  Telecomunicações.                                                                                                    são  de  ser  intocável.  Por  outro  lado,  qual­



                                           Das 185 pessoas que trabalham neste Centro,                                                                                                   quer revisão de modelo ou estratégia não po­


                                           raríssimos não se originaram de algum proje­                                                                                                  de,  sob  nenhum  título  ou  pretexto,  colocar


                                           to  do  CPqD.  Outras  empresas  implantaram                                                                                                  em risco esta formidável ferramenta de gera­



                                           em  Campinas  seus  Centros  Tecnológicos,                                                                                                    ção de cultura tecnológica, que é representa­


                                           ou  mesmo  a  totalidade  de  suas  operações.                                                                                                da  pelo  CPqD.  Este  é  um  patrimônio  que



                                           Pude  analisar  os  resultados  de  um  trabalho                                                                                              conquistamos.  Temos  que  preservá-lo,  aci­


                                           de  quinze anos.                                                                                                                              ma de  tudo.
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