Page 56 - Telebrasil - Julho/Agosto 1981
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Este número é maior do que o número de todos os átomos do tas em relação à quantidade de informação cerebral. (Por exem
universo! Seria absolutamente impossível, mesmo que o cérebro plo, não consideramos os possíveis microcircuitos entre as sinap-
mudasse com altíssima velocidade de um estado a outro, ocupar ses, que estão sendo agora postos em evidência pelos neurobiotí-
todos estes estados durante toda a vida humana. Provavelmente, sicos, e que aumentariam extraordinariamente a capacidade in
em toda sua história, com todos os seres que já viveram, a huma formacional do cérebro. Estes microcircuitos, por outro lado, po
nidade ocupou apenas uma pequeniníssima fração das confi dem ser ativados continuamente e não por pulsos elétricos.
gurações neuronais que, potencialmente, poderia ocupar. O que
é espantoso é que, apesar de tanta possibilidade de variação, te
Ainda mais, os limiares de excitação destes microcircuitos pare
nhamos comportamentos tão parecidos. cem ser centenas de vezes menores do que o limiar de excitação
do neurônio como um todo. Isto é, tudo o que dissemos foi a par
Por outro lado, fica pelo menos apontada a grande potenciali tir de um ponto de vista extremamente conservador quanto à
dade de ocupação de diferentes estados neuronais, sujeita, é cla
avaliação da informação cerebral. Deixamos ainda de considerar
ro, aos vínculos genéticos, aos hábitos sócio-culturais, em suma, a possibilidade de interação entre os neurônios, que supusemos
a todas as limitações de nosso comportamento.
independentes para o cálculo).
As duas curvas se cortam nos répteis e, por assim dizer, a barreira
informacional genética foi quebrada. A natureza encontrou uma
outra maneira de armazenar informação nos seres vivos, di
ferente da genética. Que significado pode ter este fato?
Reconheçamos que, há alguns bilhões de anos atrás, com os rép
teis, a natureza já tinha feito a barganha* entre informação gené
tica e a informação neurônica não programada. A disposição de
cada indivíduo, ao nascer, colocou a natureza um vasto número de
neurônios em branco, programáveis pelo próprio indivíduo em
sua interação com o ambiente e de acordo com as circunstâncias.
A programação biológica genética é fixa, com pouca flexibilidade,
lenta para modificar-se. Aliás, esta é a própria garantia de carac
terização das espécies. Dezenas de milhares ou milhões de anos
são necessários para a evolução genética atuar.
Fig. 2 — Evolução histórica da quantidade de bits introduzindo a in Em termos de espécie, isto é vantajoso, mas, em termos de indiví
formação cerebral. duo, com curto espaço de vida, isto é dramático, como bem o sa
bemos. Porque não atenderá espécie e também ao indivíduo? Por
que não dar maior adaptabilidade ou maior velocidade de adap-
Informação Genética e Cerebral taçãodentro das restrições genéticas de cada espécie, fornecendo
neurônios programáveis, educáveis? Obviamente há seres vivos
Voltemos agora à nossa í;igura 1. Agora está também lançada em que, ao nascer, já têm muitos neurônios programados, como nós
gráfico a curva de conteúdo de informação no cérebro contra o próprios, que temos reflexos já gravados no feto, eque, ao nascer,
tempo. respiramos, mamamos e executamos tantas outras tarefas co
ma ndadas por neurônios já programados geneticamente.
Somente que, neste caso, começamos dos anfíbios, passamos aos (imprínting),
répteis, aos mamíferos e finalmente ao homem. Esta é a curva
pontilhada da figura. Mas, dos répteis aos humanos, o número de neurônios não pro
gramados aumentou consideravelmente. Obviamente, com o
Temos agora o quadro completo ao qual queríamos chegar. Ve
maior número de neurônios não programados, mas a serem pro
mos agora algo de realmente notável: a curva de evolução da in gramados pela educação do indivíduo (e não da espécie, cuja
formação genética é cortada pela curva de informação cerebral
educação é, por assim dizer, genética), a infância do homem tem
por volta de uma época correspondente a algumas centenas de
que ser prolongada em comparação com a de outros animais,,
milhões de anos e um conteúdo de informação de cerca de alguns
com maior fração de neurônios já programados. Mas, como sem
bilhões de bits. Isto é, nesta época surgiu, pela primeira vez em
pre, esta ação da natureza resultou em uma grande melhoria bio
nosso planeta, um ser vivo, provavelmente um réptil, que pos
lógica (em termos evolutivos, é claro): os mamíferos, e o homem,
suía mais informação em seu cérebro do que em seus genes. Este
em particular, recebendo ao nascer um com putador biológico,
acontecimento tem um significado evolutivo, a nosso ver, extra
programável, puderam se adaptar melhor a mudanças rápidas
ordinário e vamos procurar explorá-lo e entendê-lo em maior de
em seus ecossistemas. Por assim dizer, a natureza fez algo de fun-
talhe. damental na escala do tempo dos mecanismos biológicos de
adaptação evolutiva: reduziu, com os neurônios não programa
O que significa esta evolução do conteúdo informacional? Mais
dos, mas programáveis, o tempo de adaptação ao nível do inter
ainda, o que significa a diferenciação evolutiva em termos de in
valo de vida de indivíduos.
formação genética e informação cerebral (ou neurônica)?
Por que o homem possui tão maior quantidade de informação Seria talvez lícito perguntar se, tendo aparecido a barreira de in
cerebral do que genética? formação a nível genético, sem o aumento drástico de capacidade
informacional a nível neurônico, o homem seria o que é ou seria
Cerca de 1 ().(X)0 vezes maior uma do que a outra, pelos nossos cál apenas uma estúpida máquina biológica sem grande criativi
culos extremamehte simplificados e propositalmente pessimis dade, não muito diferente de um protozoário ou de uma bactéria?
liilh n /A n n c tn