Page 64 - Telebrasil - Novembro/Dezembro 1976
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Acontece que se este silogismo, ê, em débito, o que atinge as raias da te- um credor, o super-direito de negar a
princípio, correto em face de certos ratologia. seu devedor o uso de serviço público.
direitos, como o alemão, não o é no
Não irei adiante nesta oportunidade.
direito pátrio. É lição pontifical do O que a Administração ou o conces
Até porque o escopo do trabalho não é
acatado mestre Carvalho de Mendon sionário não pode, um credor, por
discuitr a cedibilidade e a penhora
ça (M.I.): "A penhorabilidade não é, dívidas estranhas à relação conces
bilidade em seus aspectos doutriná
outrossim, um critério da cedibilida- sionário-assinante pode: impedir que o
rios.
de... No direito francez e no pátrio as assinante de um telefone continue as
sim não é e podemos nos felicitar pela Apenas desejo analisá-las pelo prisma sinante, tomando-lhe o direito em ação
adoção de uma doutrina mais liberal. dos interesses da administração pú de execução do débito. Com isto,
Com efeito, a impenhorabilidade de blica no âmbito da prestação dos ser violando o princípio da generalidade. A
certos bens e direitos funda-se no prin viços telefônicos. hipótese é tão absurda que não vemos
cípio da necessidade de deixar ao exe como possa prosperar.
cutado alguns bens livres, ..." (Dou Trata-se de um serviço público ao qual Outro aspecto: a efetivação da pe
trina e Prática das Obrigações, 3? têm direito subjetivo todas as pessoas
nhora de um telefone implica geral
edição, tomo II, 1938, pg. 92, § 504). capazes de assumir direitos e obri
gações. E serviço remunerado através mente no desligamento deste. Mas os
depositários não têm até hoje pago as
E tal silogismo não se aplica à assi de tarifas pelo custo, como quer a tarifas, ficando as companhias tele
natura de telefone que está, por na Constituição (art. 167) e o Código fônicas às vezes anos sem receber
tureza mesma, longe da livre cedibi- Brasileiro de Telecomunicações (Lei n? tarifas até que as demandas respec
lidade pelo seu titular. Sendo um 4.117, de 27/08/62, art. 101 ).
tivas sejam julgadas. E ao fim destas,
direito condicional — pois só existe
Nestes dois pontos agora levantados é os pagamentos, que não são corri
enquanto haja adímplência do assinan
que vamos ferir a questão do direito do gidos, se aviltam de tal maneira que as
te nos pagamentos, e é perecível pois
usuário, a outra categoria de direitos concessionárias tomam sério prejuízo.
quando, decorrido um certo prazo,
propostos pelo título do prçsente Além do que, desligados, a conta
depois do corte, há extinção, sem em
trabalho. média dos telefones, desaparece, pas
bargo da exigibilidade do pagamento
sando a incidir a tarifa básica, inferior
das tarifas até o cancelamento — para O direito subjetivo ao serviço tele em mais de 50% daquela, caracteri
que possa ser cedido, há mister o aten fônico decorre de um dos cinco prin
dimento a requisitos pré-estabelecidos cípios impostos à Administração para a zando, essa perda, um prejuízo ver
pela concessionária, como: a) quitação sua prestação: o da generalidade. dadeiramente irreparável.
dos débitos até a data da transferência E um direito cívico, no dizer de Gabino E há outras conseqüências correlatas
de titularidade da assinatura; b) assun Fraga (apud Helly Lopes Meirelles, igualmente danosas. Há pelo menos
ção de responsabilidade por parte do "Direito Administrativo Brasileiro" 4? uma empresa telefônica que toma, só
cessionário por débitos que venham edição, São Paulo, 1976, pg. 301). É na capital do Estado onde opera,
posteriormente a ser identificados; um daqueles "direitos públicos sub prejuízo mensal superior a
c) aceitação, pelo cessionário, da jetivos de exercício pessoal" de que Cr$ 1.000.000,00 (hum milhão de
privação do uso do serviço por mérito fala o Prof. Helly Lopes Meirelles, (op. cruzeiros). A perda dessa receita,
daquela assinatura, durante o período et. loc. cit). Por este princípio, da acarretando agravamento nos custos
em que se faça presente a impossi generalidade, qualquer particular pode operacionais, acaba onerando a to
bilidade técnica de instalar-se o te utilizar-se dele, em igualdade de con talidade dos usuários e assinantes,
lefone no endereço desejado pelo ces dições, perante a concessionária, sem porque esses custos têm que ser
sionário. E outros. discriminações ou privilégios (Helly cobertos pelas tarifas. Assim, cada um
Lopes Meirelles, op. cit. pg. 357). A dos demais assinantes de telefone es
Estas considerações nos permitem concessionária está obrigada a prestá-
concluir que a assinatura è um crédito lo desde que o utente preencha os pré- tão pagando preço dos serviços em
valores mais elevados porque mais de
cuja cedibilidade é condicionada à requisitos exigidos a todos os demais três mil telefones foram penhorados
concordância da concessionária por que o desejem. por débitos que não lhes dizem res
que traz em si reciprocidade de direitos
peito nem à própria concessionária.
e obrigações entre esta e o assinante. Entretanto, algumas sentenças ju
A cessão de um crédito é livre quando diciais e uma corrente de pensamento
Semelhante situação é tremendamen
unidirecional, ao credor cabendo têm entendido que a assinatura de
te absurda porque prejudica a eficiên
receber e ao devedor, pagar. O que telefone pode ser expropriada ao as
cia da concessionária, cria ônus não
não se dá com a assinatura de tele sinante por via de penhora e arre previsto para os serviços, fere, em
fone, onde, ao titular, só corresponde matação. Tal entendimento tem como bloco, o direito do assinante executado
o direito ao serviço no mês seguinte se primeira conseqüência a violação do que perde o direito a ter a disponibi
ele atendeu à obrigação do mês an princípio da generalidade, tirando ao lidade de um serviço público e o de
terior. Ambos, concessionária e as expropriado, que se encontra em todos os demais que são injustamente
sinante, são a um tempo recíproca igualdade de condições aos demais, atingidos pela elevação anormal das
mente credor e devedor. perante a concessionária, o exercício tarifas para cobertura dos prejuízos ad-
desse direito cívico. venientes dessa medida.
E se o crédito é impregnado de
obrigação, de débito inerente, não sé Serviço público, por sua natureza, não E tão alarmante a situação que o poder
pode falar em cessão de crédito, sem pode ser negado ao interessado. Mas público não pode deixar de adotar
excluir a obrigação correspectiva. E, se esse direito pode ser expropriado, medida suficientemente corretiva des
por extensão, em penhorabilidade de tal possibilidade equivale a conferir a se mal.