Page 22 - Telebrasil - Setembro/Outubro 1988
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Desenvolvimento
Japonês dá receita do milagre
"Com o advento dos computadores e m eçar pela língua e pelo alfabeto. Ado
das comunicações cresce o fosso entre os tou-se o japanese-english, simples, sem
países que detêm estas tecnologias e os irias, gram aticalm ente correto, muito
demais, sendo necessário que cada país iferente da língua japonesa, que por si
se conscientize da im portância cres só tem 50 m aneiras para expressar o vo
cente da indústria da informação”. Este cábulo eu.
foi o tema básico da palestra de Michio — O Japão viu que havia coisas im
N agari, 65, professor do Instituto de portantes a aprender fora do seu país.
Tecnologia de Tóquio e presentemente Ele era, na época, mais pobre do que o
servindo nas Nações Unidas, por oca Brasil e resolveu utilizar ao máximo seu
sião de sua visita ao Rio de Janeiro, a m ais precioso recurso: gente! E começou
convite da comunidade acadêmica orga por im itar os outros, tal como faz uma
nizadora do VIII Congresso da Socie criança que quer aprender coisas novas
dade Brasileira de Computação. — observou Nagari.
E a vontade de aprender dos japone
C&C ses foi perseguida com determinação.
Mori Arinori, que viria a ser o primei
De acordo com Nagari, o impacto ro-ministro da Educação, Ciência e Cul
das comunicações e dos computadores tura do Japão, não teve dúvidas: man
sobre o curso da humanidade excederá o dou japoneses estudarem (e até namora
da revolução industrial, ocorrida no sé rem) no Ocidente para absorverem ao
culo XIX, quando surgiu a máquina a máximo a mentalidade que havia gera
vapor e foram implantados novos méto do tal sucesso tecnológico.
dos de produção. Mas agora surge um "Estas eram idéias muito avançadas
perigo latente: a divisão do mundo entre p a ra a época. P ara os chineses, por
os que dominam as novas tecnologias da exemplo, com 4 mil anos de cultura inin
informação e os que não as dominam, te rru p ta , seria im pensável procurar
algo que faz crescer a instabilidade en kichi, um escritor influente, detectou im itar outros povos, ainda que sua lin
tre nações ricas e pobres. quatro pontos que, na época, seriam a guagem fosse formada por nada menos
— E preciso que os países desenvolvi causa do avanço ocidental sobre o Ori ao que 50 mil caracteres”, disse o con
dos transfiram conhecimento para os ente: máquina a vapor, im prensa, co ferencista. Mas a absorção dos valores
que estão em desenvolvimento, mas é municações elétricas e sistema postal. ocidentais pelo Japão não aconteceu
preciso também que estes se preparem As comunicações, o correio e a imprensa sem traum as. Desde da época Meiji, na
para recebê-lo — aconselhou o conferen permit iriam âs pessoas produzirem ju n segunda m etade do século XIX, até os
cista, que passou a historiar o esforço tas, mesmo distantes, e a energia do va dias de hoje renova-se o debate entre o
que o Japão fez, no passado, para absor por permitia mover cargas através dos dilema da ocidentalização e a manuten
ver a tecnologia do Ocidente. mares. ção dos valores tradicionais —• ikebana.
"Em 1868 o povo japonês fez uma Uma vez decidido de seu atraso rela kanji, origami, kimono — perpetuados
análise de seu atraso relativo em rela tivo, o povo japonês partiu para a ação. através dos séculos.
ção a outros países mais desenvolvidos. Foi a fase da im itação. A idéia era imi Prosseguiu Michio Nagari dizendo
Foi a fase do diagnóstico. Fukunaga Yu- tar o Ocidente o máximo possível. A co que as elites no Japão são muito respei-
Para francês, cientistas do 3v mundo ficam frustrados
Jacques Salomon, especialista mun melhor ensiná-lo a pescar”. Como funda ciam de seu ambiente social ou deixam de
dial em desenvolvimento, veio ao Rio, a dor da Divisão de Políticas de Ciência e competir (por falta de recursos) a nível
convite do CNPq, para falar sobre tec Tecnologia, do Mercado Comum Euro mundial, o que os deixa frustrados”, co
nologia e progresso. peu, ele sentiu-se a vontade para dizer mentou ele, com realismo.
— Máquinas são apenas máquinas e o que a cooperação tecnológica, entre paí Por outro lado, reconheceu o conferen
desenvolvimento depende não só da tec ses, tal como no projeto E sprít, dá muitos cista, que há cerca de um século, ou me
nologia, mas também de todo um contexto bons resultados, mas que, por outro lado, nos, Brasil, China, índia vêm lutando
social, religioso e até filosófico, onde ela a competição, como ocorre entre Japão e para conseguir maior autonomia tecnoló
se desenvolve. Não obstante, decisões tec EUA, é igualmente um mecanismo eficaz gica no cenário internacional. Assim já se
nológicas podem vir a afetar, drastica para promover o progresso. justifica, nestes países e em certa propor
mente, o destino do homem e assim o téc E o que será melhor para um País em ção, manter esforço na área do desenvol
nico não deve ficar alheio ao aspecto so desenvolvimento: concentrar esforços em vimento científico. Ao tratar do assunto
cial de suas decisões — sintetizou o pales ciência ou em tecnologia? Para Salomon, do comércio internacional, previu o pales
trante, acrescentando: um bom pesquisador básico é quase um trante que deverá crescer a ameaça repre
— Decidir prioridades, a médio prazo, artista e os resultados que alcança, em sentada pelo protecionismo interno, de
é o cerne da questão da tecnologia, visto tese, ficarão disponíveis mundialmente. uma maneira geral, ainda que o surgi
que, graças a ela, é possível obter grandes Nos países em desenvolvimento, o saber mento de facilidades crescentes de trans
saltos desenvolvimentistas, mas que po científico, segundo os rígidos critérios do portes e de TCs possam vir a reduzir tal
dem não atender às necessidades globais palestrante, "tem utilidade apenas para efeito. Finalm ente, acha Salomon que
da sociedade. instruir novos cientistas”. Citou Salomon tende a desaparecer a distinção clara en
Classificando de "armadilha” investir que o Japão, até os anos 70, pouco pesqui tre cientistas e engenheiros, a não ser o
recursos na aquisição de ultratecnologia, sou em ciência básica, apesar do alto de fato de que os últimos visam tanto quanto
em detrimento do nível educacional mé senvolvimento industrial do País e que só possível obter resultados, a muito mais
dio da população, acha Salomon que se al agora sentiu tal necessidade a fim de al curto prazo do que os primeiros. É o caso
guém necessitar comer "pode-se, sem dú cançar novo estágio de progresso. Quanto de se acrescentar: se non è vero. è ben tro-
vida, dar-lhe peixe, mas que é mil vezes aos cientistas do 3? Mundo "ou se distan va to. (JCF).