Page 18 - Telebrasil - Julho/Agosto 1981

Odisséia de um Industrial

Produzir, substituir importa­ Homologado o equipam ento, é preciso Como entre o que vai ser importado há mi­

ções é bandeira nacionalista, é agora conseguir participar da distribuição croprocessadores e há exigências nessa

I I I programa do Governo que, do mercado. Como os critérios dessa divisão área, contrata novo escritório especializado

para executá-lo, tem uma má­ mudam com frequência, a conquista do qui­ para cuidar de seu licenciamento. Mais
I I I quina adm inistrativa e até nhão que pleiteia deve ser obtida à base do tempo, mais despesas, mais explicações até

mesmo o próprio mercado em convencimento e dos resultados de uma en- a assinatura do termo de compromisso, Está

suas máos. A indústria nacio­ comenda-piloto Com isso, novo desgaste agora com liberdade vigiada. Volta entáo

nal está com luz verde e até mesmo ante um em tempo e despesas, mas ainda tem algum aos órgãos que controlam a importação e

desafio patriótico. O problema maior seria a ânimo de reserva. tem a "feliz" notícia que está vencido o pra­

aquisição da tecnologia necessária, no ex­ zo de validade da PGI. E começa tudo de

terior, com firma que queira cedè-la e asso- A preparação do plano de importação é algo novo (é preciso não esquecer que na buro­

ciar-se a empresa nacional, em situaçáo mi­ que escapa aos leigos, e até mesmo aos ini­ cracia as dificuldades são em série, talvez

noritária. ciados É preciso por isso contratar firma es­ como forma de seleção).

pecializada que saiba onde está a ponta do
Depois de pesquisas e viagens, o empre­ "fio de Anadne" Perde a primeira tenta­ Ante as dificuldades de importação, foi

sário brasileiro, de fato, encontra o parceiro tiva, mas um recurso bem elaborado lhe dá aconselhado a "baipassá-las", mas resistiu ã

e assina contrato. Constitui uma firma. Para ganho de causa. tentação e enfrentou-as, observando o

registrá-la, tantas sáo as certidões, que tem "figurino". Para não desestimular os fu­

que recorrer a alguém especializado para  medida que vence etapas, perde tempo e turos industriais, vamos cortar os detalhes

vencer os entraves. Descobre, entáo, que o dinheiro (e depois não se sabe porque o pro­ deste capítulo, até mesmo porque Dante,

contrato que firmara no exterior precisa ser duto nacional é caro!). em sua obra, |á sintetizou na legenda à en­

aprovado pelo INPI Face a natureza do pe­ trada do inferno o que nele se pode esperar;

dido, julga recomendável valer-se dos servi­ O plano foi finalmente aprovado O plano, desnecessário, portanto, repetir. Transferiu

ços de um escritório especializado. Após al­ sim, mas a guia, não, pois seu valor excede a o problema para um despachante, que con­

gum tempo, conclui que as condições que USS 100.CKX) e, pela portaria 638'BC, é pre­ seguiu desvencilhar-se dos problemas

lhe sáo ditadas não sáo aceitas pelo sócio de­ ciso obter financiamento externo. De nada ad uaneiros.

tentor da tecnologia Ante a perspectiva de vale alegar que tem dinheiro, que não quer

perder dinheiro e trabalho, aceita fazer um onerar a balança de pagamento. Perdida a Finalmente, chegou-se á fase

acordo de cavalheiros com o pãrtnor. parada, contrata novamente um escritório in d u s tria l! S a iu do mau

especializado para conseguir um agente fi­ tempo, agora é priniuzir, e au­

Vencida essa etapa, vem a da procura do ter­ nanceiro capaz de financiar o que precisa mentar o PNB, e criar mercado

reno, da construção do imóvel, aquisição de importar. Sem tradição e maior lastro, os de trabalho. E ser um realiza­

máquinas e contratação de pessoal. Novas juros pedidos se elevam além do permitido. dor realizado.

exigências federais, estaduais e municipais
Novo acordo de cavalheiros, em que o outro

o levam a contratar serviços de firmas espe­ lado ^ern a parte do leão. I o preço de se ter Depois de uma longa luta, normal nos casos

cializadas. Apesar de assessorado, nao saiu mais uma indústria nacional, voild... de conquista de mercado, e surpreendido

incólume. com a noticia de que náo há verba, por ter
sido limitado o investimento. Mas, se a

verba nao vem do orçamento público e, sim.

das tarifas, por que a limitação?! Náo enten­

Ao ingressar na fase propriamente indus­ Ultrapassada a fase da ho­ deu (m as náo é para entend er, é para
fabricante nacional, o que requer que seu E luta. por ter agora que passar cumprir).

trial, fica sabendo que para fornecer a em­
mologação, não está vencida a
presas estatais é preciso ser registrado como

projeto seja aprovado pelo GDI Contrata pelos órgãos que controlam a E é assim que querem estimular a indústria
nacional?. Desabafou
importação, pois precisa im­
mais uma vez um escritório especializado portar certos insumos e bens

para apresentar carta-consulta que, se de­ ¦ 1 1 de capital ainda necessários. Náo seja pessimista, companheiro, você

ferida, irá requerer a apresentação de um "só" dispendeu dois anos. Já imaginou se

projeto definitivo para o citado órgão, o que precisasse passar pelas siglas que ainda

será feito pelo escritório que contratara. As Após meses aguardando a aprovação da restam? Afinal, o que você náo dispendeu

dificuldades encontradas não alteram sua •guia, descobre que não pode importar este em comprar insumos rendeu algo no open

determinação, pois chegou ao point o f no re­ ano, porque não importou nada no ano pas­ Poderia ser pior, náo acha?

sado e a política é reduzir de 20'a as importa­
turn
ções do ano anterior. De parte do industrial, Ante esse consolo, pensou com seus botões:

A fábrica é inaugurada. Um dia de festa. Re­ a reação mais nacionalista é respirar fundo e uma indústria, assim tão bem protegida,

acende-se a esperança. As dificuldades ven­ tentar convencer aos homens do outro lado pode até se dar ao luxo de dispensar inimi-

cidas animam a conversa. Tudo agora reside do guichê que, sem ovos, não poderá fazer os, pois está com tudo. Mas na próxima (se

na qualidade e preço do produto. Pois sim, om eleta; que não quer fazer "sop a de ouver), vai montar um escritório especiali­

istoé verdade para um mercado aberto, mas pedra" com o que pretende importar, de vez S
zado em advocacia administrativa e sugerir
não quando as empresas compradoras sáo que um percentual pequeno de importação, a um inimigo que monte uma industria na­

estatais. Neste caso, é preciso ainda que o representado por alguns insumos neces­ cional.

produto seja homologado. Aquelas delon­ sários, permitirá a produção de equipamen­

gas, aquele papelório, mais esclarecimen­ tos que deixariam de ser importados. Incrí­

tos, enfim, uma verdadeira recaída de buro­ vel quanto pareça, consegue convencer seu

cracia. Após ter nadado tanto, não é justo ex-adverso que, por pouco, não "provou"

que morra na praia. Vai em frente. que era ele quem devia 20% á exportação. (C ontribuiçjo: J.C . VâlUmí

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