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O NACIONALISMO
                                                — O GLOBO — 21-2-63 —

Quem imaginar que o chamado na­ qualquer coisa ligada a um passado,

cionalismo está em repouso, depois de ainda não esquecido, de colônia. Mas

tantos danos e desgraças ocasionados as portas do país estavam abertas

a êste país, engana-se. A luta do na­ para a colaboi’ação alienígena e a par­

cionalismo contra o Brasil grande país te mais numerosa, atuante e culta do

é incansável. E ’ uma luta decisiva, de nosso povo repelia os excessos de res­
                                         sentimento de alguns. Havia mesmo
extermínio. Enquanto sobrar alguma       uma tendência a não levar a sério os
coisa de pé, enquanto a triste, querida  chamados extremistas da época e ês-
                                         tes se limitavam a discursos, apu­
e desditosa pátria oferecer resistên­
cias, demonstrar que vive e respira      pos, etc.
— o nacionalismo não se dará por sa­

tisfeito.                                Hoje a «doença» adquiriu aspectos

Trata-se de uma praga como o Egi­ bastante graves e já conseguiu vitó­
to não conheceu igual. De repente, ve­ rias de grande monta contra o país.
mos esta nação modificar-se, trans­ E ’ um nacionalismo que agride a eco­
formar-se, virar o que nunca foi nem nomia brasileira e cujo objetivo pare­
quis ser. Uma insidiosa, insistente e ce ser o empobrecimento indistinto e
bem organizada campanha — mas geral desta nação. Num Congresso que
com bases grotescas e primitivas — até aqui se portou sem qualquer re­
começou a assolar êste país, a devo­ sistência à mentalidade primitiva que
rar os meios políticos, a sacudir a ju­ o nacionalismo representa, vemos que
ventude. Não me lembro de ter visto a ação nefasta apresenta frutos tão
um fenômeno de formação de opinião amargos que muitos já se convence­
pública tão misterioso. Sempre existi­ ram de que o Brasil se tomou irre­
ram «chauvinistas», inimigos de es­ cuperável. A luta contra o capital es­
trangeiros. No meu tempo de adoles­ trangeiro, corporificada e codificada
cente, eram os portuguêses as vítimas na famosa Lei de Remessa de Lucros,

dessa mentalidade. Jakson de Figuei­ é um exemplo do que pode ser obtido

redo rompeu com o nacionalismo por­ com um simples bater-a-clara de fal­

que não admitia que um brasileiro se sidades, mentiras, lugares-comuns.

voltasse, em termos negativos, contra Não há nada que resista. Considero

Portugal. Vaiava-se um homem como essa lei de «remessa de lucros», apro­

Carlos Malheiro Dias porque escreve­ vada unânimemente, um resultado
ra um romance, «A Mulata», em que, bastante convincente dò que aconte­

segundo a exaltada opinião dos «pa­ ce com democracias construídas em

triotas», a mulher brasileira era de­ cima do atraso, da falta de informa­

gradada... Pura asneirice, que es­ ção. E ’ uma lei contra o Brasil, em

palhava os nossos complexos de pou­ todos os seus aspectos, contra o tipo

ca maturidade. Floriano Peixoto de país que desejamos, é uma lei de
encarnou a figura do herói na­ claro, insofismável, rápido efeito ne­

cionalista, embora fôsse silencioso, gativo. E, no entanto, o chamado «na­
enigmático, descretíssimo. «À bala», cionalismo» formara tal ambiente em
respondera êle, ao receber uma im­ tôrno das palavras «capital» e «es­

pertinência da Inglaterra. Mas êsse trangeiro» que não houve qualquer

nacionalismo era superficial e não reu­ resistência sensata que pudesse de­

nia os aspectos negativos e mórbidos ter êsse atentado ao nosso desenvol­

do nacionalismo de nossos dias. Era vimento.
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