Page 27 - Telebrasil - Setembro/Outubro 1990
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nergia, transportes, comunicações), quebran dutiva do País poderão, em conseqüência, ser nistro Bresser Pereira. O banco, instituído em
do monopólios — estatal ou privado. extintos” . 1945, já emprestou ao Brasil — o 2o País que
Já Winston Fritsch, da PUC/RJ, se preocu Um outro ex-Ministro da Fazenda, Bresser recebeu mais empréstimos (o Io é a índia) —
pa com a retomada do desenvolvimento (5 a Pereira, ele mesmo autor de um Plano de ajus 16 bilhões de dólares, dos quais 3,7 bi foram
6% do PIB a/a) incluindo aumento dos inves te econômico, lamentou que não houvesse ti para energia, 2,6 bi para transporte, 1,3 bi pa
timentos (15% do PIB) e do salário médio da do um acordo social, prévio, ao Plano Brasil ra indústria). Na área social, os empréstimos
.população (mais 50% em 10 anos). Será neces Novo, o que teria simplificado as coisas e critL foram menores: saúde e nutrição (0,6 bi), edu
sário para isto, incentivar a poupança, a expor cou o “extenso vazamento havido entre as mo cação e treinamento (0,3 bi).
tação e a produtividade do aparato econômi edas do Cruzado Novo e do Cruzeiro” . Eis, numa imagem rápida, como funciona
co. Ele acha 'porém que existe um fosso entre Quanto à liberalização do comércio exte o Banco. A captação dos recursos é feita no
as medidas ortodoxas do Banco Mundial e do rior, ela deve ser conduzida de forma abrupta, mercado internacional de capitais. Há o repas
FMI (privatização, liberalização, reforma finan visto que approach gradualista é algo que não se desses recursos para os países em desenvolvi
ceira) e a realidade “ heterodoxa” dos países funciona mais nestes casos. E a indústria nacio mento. As negociações com o Banco são fei
subdesenvolvidos. A tese do professor da PUC/ nal irá aguentar o choque da competição exter tas, apenas, pelos Ministros da Fazenda dos
RJ é a de que a abertura para o comércio na? Sim, acha Bresser Pereira, para quem nos países interessados. Os Governos dão aval ao
exterior deve ser seletiva e não total, dei so parque industrial já é maduro suficiente pa Banco. Cada projeto de empréstimo sofre o
xando o Governo alguns setores quebrarem e ra isto, mesmo que possua alguns segmentos crivo do Banco, relativo aos aspectos económi
outros sobreviverem, de acordo com o interes ineficientes. cos-financeiros e, mais recentemente, ambien
se estratégico do País. Ainda mais, Winston tais. Prevê-se que o Banco irá emprestar dinhei
Fritsch opina que um processo intenso de libe ro ao Brasil para implementar a infra-estrutu
ralização deveria ocorrer em uma economia Dívida ra necessária ao aumento das exportações, e
em expansão, a fim de garantir o nível de em como recursos destinados à privatização das
prego dos setores que estão diminuindo. A solução do problema da dívida externa empresas. O Banco não opera a fundo perdi
Mais ou menos dentro da mesma linha de é crucial para quatro outras medidas econômi do e se preocupa em ter retorno e rentabilida
pensamento, Paulo Renato da Costa, da Uni- cas: o ajuste fiscal do Governo (gastar só o de nos investimentos que efetua.
camp, questiona se um liberalismo total irá de que arrecada); a estabilidade da economia; a As teses do Banco, bem como do FMI, de
senvolver o País ou se a exemplo da Europa retomada do desenvolvimento; e o crescimen fendem a liberalização. Mas, afinal, o que is
— que ele chama de dirigismo econômico bem- to das exportações. Negociar a dívida é nego so significa? Demetrios Papageorgiou, do Ban
sucedido — não seria preferível aplicar um con ciar primeiro com o Banco Mundial e com o co Mundial, esclarece que “ as pessoas agem
junto coerente de políticas dirigidas para edu FMI e depois partir no corpo-a-corpo, banco sempre de acordo com o interesse próprio e
cação, ciência e tecnologia e investimento in a banco, com o credor privado. “ Porém o im que seu comportamento econômico é conseqüên
dustrial. portante, nisto tudo, é defender o interesse na cia do jogo de preços” . Ele lembra, então,
cional (todo País faz isto) e mesmo que sejam que o Estado, ao mudar as regras do jogo eco
ditas coisas amáveis aos credores internacio
Desafios nômico, mesmo recorrendo ao uso da indexa
nais, o montante a ser pago não poderá des ção, perturba o referencial do sistema produti
truir nossa economia” , alerta Bresser Pereira.
“ Do ponto de vista histórico, a ideologia vo. A liberalização é contra o intervencionis
do Brasil é progressista e não recessiva. Até a mo do Estado. “ No caso brasileiro, o Estado
década dc 60, o modelo de desenvolvimento tem absorvido a poupança do País, dando-lhe
foi bem-sucedido, com substituições de impor pouco em retorno e demonstrando não ser
tações e mercado interno protegido. A partir um bom gerente” , observa Papageorgiou. O
dos anos 70, o modelo foi artificalmente pror Banco monitora permanentemente a economia
rogado e demonstrou seu esgotamento na déca- mundial. Na visão de Stanley Fisher, outro téc
da de 80” . nico do Banco, “ as perspectivas de crescimen
Assim, Márcio Fortes, presidente do Ba- to futuro das economias dos países em desen
nerj, descreve o quadro brasileiro que ele vê, volvimento não são boas e os países altamen
hoje, confrontado por quatro dilemas: distri te endividados deverão contar nos próximos
buir a poupança do País entre o industrial c anos apenas com a utilização de suas próprias
o social, “cujas carências são tão grandes” ; poupanças internas, caso queiram crescer” .
orientar a política industrial rumo às grandes
ou às médias e pequenas organizações: dosar O fator social
o fator brasileiro e o estrangeiro na abertura
para o exterior; e escolher o que deve ser pú “Os indicadores sociais do Brasil se caracte
blico e o que deve ser privado, que contém rizam por uma distribuição extremamente desi
em seu bojo, “ um processo dc privatização gual da riqueza e de privilégios, algo que pre
delicado” . ocupa até organismos internacionais” , diz Jo
Mudar a cultura do País é a tônica defendi sé Lins Miranda, do Banco Interatlântico, ao
da por Maurício Pinho, presidente da Casa passo que o consultor de empresas, Alberto
França-Brasil, que vê na simples adoção de Furuguem, observa que “ há muito imobilis
medidas liberalizardes, dc cunho pragmático, mo por parte do Governo na captação de em
apenas um paliativo dc curto prazo para a préstimos externos” .
atual crise. A tradição brasileira, herdada da Luiz Carlos Bresser Pereira (ex-Ministro da O problema da dualidade — a existência
Era Colonial, é a da centralização política e Fazenda). de ricos e pobres — sempre existiu, porém
para liberar a economia haverá que contar com nos primórdios da Revolução Industrial, seto
o real apoio dos partidos políticos, bem como res pioneiros tomaram a dianteira e depois pas
da maioria da sociedade. Ser pragmático é o saram a modernizar os demais. No Brasil, que
que preconiza o ex-Ministro da Fazenda Ema Jório Dauster, Embaixador Extraordinário é um País de industrialização tardia, tal fenô
ne Galvêas. Assim, ele recomenda que a abertu para a Dívida Externa, lembra que não serão meno não aconteceu contribuindo para criar
ra para o exterior deve fugir ao academicismo os rnega-superávits cambiais que resolverão o o fosso entre a sociedade industrial e a socieda
c levar em conta que o livre comércio interna problema da dívida externa. Ele explica que de que permanaceu primitiva e a inflação só
cional “não é tão livre assim” . Já em relação grande parte da dívida foi feita pelo setor pú fez piorar esta situação, explica Furuguem.
ao Plano Brasil Novo, seu ponto central não blico, um fato que desvia recursos privados Por sua vez, o presidente do grupo Brascan,
foi o da reforma monetária, “ administrada para o Governo e causa pressões inflacionárias. Roberto Paulo de Andrade, cita que o índice
com alguns equívocos” e sim as reformas, fis Concordando com Bresser Pereira, ele admite inflacionário atingiu 50,4 milhões por cento,
cal e administrativa, que irão “ reformular a que o Brasil não pode, sob pretexto de pagar no período de 79 a 89, mas que a ciranda fi
estrutura do País” . a dívida, exportar capitais para os países credo nanceira salvou o rico ao lhe criar uma moe
O economista Antonio Barros de Castro, res, como fez na última década. Conclui Jório da indexada, a que o pobre, virtualmente, não
da UFRJ, é outro que alerta para a reformula Dauster: “ De nada adiantarão cartas de inten teve acesso. O término da inflação, apesar de
ção do comércio exterior, que “ deve ser feita ções, com compromissos inadiáveis, se não hou causar recessão, irá beneficiar o pessoal de
cercada dos devidos cuidados” . Quanto ao fu ver uma renegociação da dívida. Não existe, é menor renda, conclui o executivo do grupo
turo dc nossa economia, Barros de Castro não claro, banqueiro que aceite reduzir uma dívi Brascan.
demonstra otimismo. As perspectivas para os da, mas existem muitos que vão querem trocar Referindo-se à questão se uma política libe-
próximos dois anos serão de recessão e desem uma cobrança ruim por outro compromisso ralizante irá aumentar, ou diminuir, a concen
prego. As empresas terão que competir mais mais exequível” . tração de renda, o Embaixador José Botafo
intensamente visto que elas enfrentarão agora go Gonçalves — um especialista em Dívida Ex-
um consumidor mais seletivo e atento ao em Banco Mundial terna — é de opinião que um livre mercado
prego do seu dinheiro. Por outro lado, a aber contribui para consolidar a democracia e irá
tura para o exterior fará crescer a competição O Plano Brasil Novo segue as diretrizes melhorar, sobremaneira, a distribuição da ri
interna e “segmentos inteiros da estrutura pro do Banco Mundial. Quem observa é o ex-Mi- queza. (JCF)