Page 54 - Telebrasil - Janeiro/Fevereiro 2001
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U m governo desfigurado
Martins
Quando Fernando Henrique assumiu a presidência da
República em 1995, as esperanças brasileiras de um novo
ciclo de desenvolvimento e de consolidação definitiva da
democracia eram fundadas. As promessas de campanha, tais
como reformas tributária, previdenciária, administrativa,
política e do Judiciário, pareciam conformar uma nova realidade, em que o Brasil,
enfim , despontaria como uma grande nação.
E as grandes diretrizes de seu Governo Por outro lado, para as privatizações, o no, pouco interessado em desenvolver a re
rcduziram -sc àquelas promessas, não se es BNDES financiou inúmeros investimentos gião, cuja área é maior do que a dos 11 países
forçando por implementar nenhuma delas c externos, de tal maneira que o balanço de pa da Europa Ocidental que formam o núcleo
renegando, em m atéria tributária, tudo o gamentos, para os próximos anos, será dra das maiores potências da União Européia.
que sugeriu. mático, visto que: Por outro lado, as Leis Complementares
D e lá para cá, o País se desfigurou, nada 1) as empresas privatizadas para os investi 104 e 105 violam, de forma nítida, a Consti
obstante a propaganda oficial, que faz parecer dores estrangeiros começarão a enviar divisas tuição Federal, atentando contra direitos es
já estar o Brasil entre os países desenvolvidos. para o exterior; senciais dos contribuintes, que nem o regime
A Colômbia está melhor situada que o Brasil 2) o estoque de empresas privatizáveis pelo militar teve coragem de violentar.
no r a n k i n g das nações com credibilidade fi Governo será menor, prenunciando menor Votei em Fernando H enrique duas vezes.
nanceira, como estão o México, o Chile, o entrada de capitais; e Como seu eleitor, a quem deve ele servir, como
Uruguai c outras nações latino-americanas. 3) à falta de política tributária de expor a toda a Nação, tenho o direito de protestar
Enquanto a Coréia exportava o mesmo que tação, o Brasil continuará sem competitivi contra um governo que se desfigura, embora
o Brasil na década de 70 — em que o regime dade, porque continuará exportando tribu entenda que ainda haja tempo para recom
m ilitar ofertava maiores garantias aos con tos. O déficit na balança comercial, portan por o quadro. Para tanto, contudo, haveria
tribuintes que o Governo de FH C —, em 2000 to, crescerá. de ter consciência de que não é o Governo
exportou o dobro que o Brasil (mais de USS O Governo, que não gera empregos, per que gera o desenvolvimento, mas sim a soci
100 bilhões), visto que o atual Governo reti manece, com uma tresloucada política de ar edade, e que a melhor forma de permitir que
ra competitividade dos produtores brasilei recadação, vampiristicamente retirando, de a sociedade cresça é eliminar as amarras bu
ros, obrigando-os a exportar, junto com os qualquer forma, recursos do segmento que rocráticas, im plem entando as reformas que
produtos, tributos em cascata, apesar de uma propicia crescimento e que, apesar dos gover não fez e completando as que fez insufiden-
insuficiente desoneração ofertada pela Re nos, tem permitido à nação sobreviver. temente, como a previdenciária c a adminis
ceita FederaL A reforma tributária tem sido nitidamente trativa. E de todas elas, a reforma tributária
O s juros, na maioria dos países latino-ame torpedeada pelo próprio poder, embora reco é a mais im portante, desde que voltada para
ricanos, são muito menores do que no Brasil. nheça que o projeto elaborado pelo Congres o desenvolvimento do País e para a justiça
São particularmente elevados para o empre so Nacional não era bom. fiscal. O aum ento de arrecadação seria uma
sário brasileiro, pois a política imposiõva (pró Quanto à soberania nacional, nada fez o natural decorrência. I HM
pria da idade da pedra) leva a tributar a circu Governo para afastar os “gordos olhos" de Para tanto, seria necessário ouvir mais os
lação do dinheiro, com a C PM F e o IOF. outras nações sobre a Amazônia. Ao contrá representantes da sodedade e menos os polí
Enquanto os outros países procuram pre rio, procura destruir o único pólo de desen ticos e burocratas, pois estou convenddo de
servar os empresários nacionais para contra volvimento da região, a Zona Franca de M a que são aqueles que geram o progresso e não
balançar sua presença na economia com a dos naus, sabiamente preservada pelos constituin estes, que, salvo honrosas exceções, quase sem
investidores estrangeiros, o Brasil os rotula tes até 2013, com uma duvidosa Lei de Infor pre são “produtores” de atraso, arbítrio, cor
genericamente de sonegadores, apesar de se mática para beneficiar umas poucas empresas rupção e “semeadores" de tirania.
rem os principais mantenedores de emprego e multinacionais. * Este texto foi publicado originalmente no "0 Globo*
do desenvolvimento, suprindo as muitas fa Se, um dia, perdermos a Amazônia — e já de 30 de janeiro. 9
lhas da política econômica do Governo fede tive que defender o direito a soberania contra
Ives Gandra da Silva M artins é professor
ral. Recebe o Estado brasileiro 33% do PIB aquele de “ingerência” das grandes nações pe
Emérito das Universidades Madcenzie. Paulista
em nível de tributos—mais do que os Estados rante professores alemães que propugnavam
e Escola de Comando e Estado Maior do
Unidos, Japão, Portugal ou Espanha - , mas sua internacionalização, em fórum de que par
Exérdto, e presidente do Conselho de Estudos
oferece serviços públicos dignos do Congo, ticipei, realizado em Bonn (Alemanha), cm Jurídicos da Federação do Comércio do Estado
Serra Leoa, Etiópia ou Ruanda. 1991 - , a responsabilidade será deste Gover de São Paulo.