Page 70 - Telebrasil - Março/Abril 1985
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tual, traduzido em computador do qua]
Volto agora à sua questão anterior,
que é a mais difícil, nem tenho vontade tam bém é dependente. Veja bem;i
de respondê-la. Quem estará no poder? imagem!
Digo que serão pessoas mais jovens, com Situação bem diversa seria se eu po*
capacidade de raciocinar, de captar os suísse o meu próprio computador, com
problemas a longo e curto prazos. Capa minhas próprias memórias, no meu pró.
cidades mais intelectuais, deve-se fri prio território. Lá eu sou o dono, eu
sar. Sei que é meio vago, mas o que ve guardo, eu empresto, eu determino. Mi
nho tentando explicar em minhas con nha memória é minha enciclopédia e
ferências é exatamente a oposição entre minha enciclopédia está sujeita ao meu
a sociedade "regalienne” e a sociedade computador pessoal. Mas eu a possuo,
convivial. Trata-se de um problema de ela não está longe como numa organiza
estrutura geral e propus dois tipos de so ção (rede) regalienne, está na minha
ciedade. casa, eu a consulto quando quero.
E — Ú sr. poderia falar sobre a impor
E — Como explicaria o que é uma socie
dade "regalienne”? t â n c i a d o c a s a l n a s o c i e d a d e d a
M — Primeiro a idéia de uma sociedade informação?
onde as redes são construídas utilizan M Considero a unidade do casal como
do-se aparelhagens dispendiosas, gran a unidade fundamental da vida. Creio
des sistemas cujo preços excedem de to "Penso que os jovens são no indivíduo mas posso dizer que os
das as maneiras a capacidade do indiví valores fundamentais do mundo em que
duo. Em outras palavras, a "rede” sub-utilizados em sua vivemos são o indivíduo e o casal, o ver
abrange investimentos em estradas, capacidade intelectual” dadeiro casal. Aquele em que a sexuali
aviões, etc. E um serviço social que se dade tem papel importante mas onde
expande, que cobre e molda toda a socie também atuam outros pontos determi
dade. As pessoas que acessam esta rede nantes, como a comunhão intelectual,
têm a posse do que é veiculado por ela, aptos entram na organização da rede e por exemplo. E o que acontece comigo: a
ou seja, as informações, os conhecimen temos assim todo um sistema. E o que maior parte dos livros que escrevi ulti
tos, os dados. Possuindo os dados, pos chamo de sociedade "regalenga” (regali mamente é assinada por minha compa
suem o poder. Possuem, em outras pala enne) e creio ser para onde tendemos, já nheira e eu. Poderíamos dizer que a
vras, a própria sociedade. que ela está parcialmente em funciona mim cabe mais a realização e a ela a or
mento. ganização. E claro que entre nósexistet
E — Isso não é perigoso? hábito do convívio, o costume, etc. mas
M — O risco é que este processo de con E — E quanto à sociedade da informa- existe também o entusiasmo que nasci
densação e de concentração aumente ção?
sempre o poder. Uma autogeração de po M — O que ficou patente é que nossa so
der, mais e mais, semelhante a uma ciedade caminha da condição de socie
bola de neve, que simplifique, penetre e dade de realização, do trabalho, do arte
defina as características das mensagens sanato, para a sociedade de pura infor
que podem circular nestas redes, o que mação. Haverá sempre os autômatos
não pode, o que deve ser eliminado. Este para fazer os trabalhos práticos, tere
poder seria a própria censura. Mais do mos somente que comandá-los. Isso é in
que isso, seria o poder de modelar a formação, conhecimento, dados, nú
forma dos seres pelo que eles podem di meros, comunicação. Vimos que a socie
zer, comunicar, fazer, interagir ou não. dade industrial desliza de uma socie
Temos, portanto, primeiro a rede, de dade de produção, no sentido material
pois as pessoas adaptadas à rede e de (carvão, trigo) para uma produção infor
pois o poder da rede. Os indivíduos mais mática.
E — Existem outras alternativas?
M — Há outra alternativa na qual a in
formatização se faz na escala do indiví
duo. O indivíduo recolhe, desenvolve
seu territó rio , seu campo pessoal.
Campo talvez im aterial, mas ainda "Quando se ama
campo. todo mundo, não
Há um bom exemplo dado por um de
meus colegas que sendo um profissional se ama ninguém”
da informática, se serve bastante dos
sistemas de dados, mas não conserva ne
nhum arquivo pessoal. Todos os seus ar
quivos estão no computador. Acontece de saber que pensamos juntos a mesma
que para que os computadores conser coisa. Em outras palavras, a solidarie
vem arquivos, precisamos pagar por dade e a lealdade são essenciais. Uma
isto. das coisas mais odiosas no mundo con
Suponhamos que, por um acidente temporâneo é o sistema social que ins
"As grandes cidades qualquer, ele não possa mais pagar. tala a denúncia e o policiamento na vida
criam a ideologia da Neste caso, o sistema vai apagar auto do casal. E claro que existem casais que
maticamente todos os dados. Em outras
não dão certo, mas isto é problema deles.
desumanizaçáo do ser” palavras, sou dependente desta estru A lealdade fundamental é uma coisa so
tura que é frágil. Todo o trabalho pas bre a qual o mundo exterior não deve ter
sado de uma pessoa, seu poder intelec nenhum poder.