Page 58 - Telebrasil - Setembro/Outubro 1979

transformações qualitativas do próprio arca­
bouço social de que o homem é sujeito e objeto.
Estejamos, pois, preparados para enfrentar as
tensões, os impulsos desordenados e as forças
despreendidas desse processo de transformação
social, que balançarão hábitos e regras de convi­
vência social, que deslocarão para estruturas di­
ferentes o sistema produtivo prevalescente e im­
porão novos contornos ao quadro político aceito
no chamado pacto social vigente. Estejamos pre­
parados para compreender que a conquista e a
utilização das tecnologias da informação forma­
rão a alavanca mais poderosa dessas transfor­
mações e deverão, para beneficio de todos, ser o
objeto do controle da sociedade e do Estado.
Na perseguição da obtenção das tecnologias da
informação — indispensáveis, para enfatizar
mais uma vez, ao crescimento econômico e ao
desenvolvimento sócio-cultural de um país — a
sociedade se depara, entretanto, com obstáculos
de natureza interna e externa.
3. Fatores Limitativos e Formas de Superá-los
No tocante às limitações próprias aos países em
desenvolvimento, surge, a meu ver, como a mais
visível e expressiva a insuficiente capacitação do
complexo científico-tecnológico. Os outros fato­
res limitativos, da maior significação, são a fra­
gilidade da infra-estrutura industrial e comercial,
a influência preponderante das transnacionais, e,
finalmente, a ausência de uma política coerente
de informática.
Não pretendo oferecer receitas específicas para
minimizar ou eliminar esses obstáculos, fixando-
me em considerações de caráter genérico, mais
próximas ao conceito de estratégia, pois cabe a
cada país a função, inerente á ação governamen­
tal, de adotar as medidas especificas que melhor
atendam aos seus interesses.
A fraqueza do complexo científico-tecnológico
advém, na grande maioria dos países cm desen­
volvimento, dc condições
existentes ao momento que vivemos. Domina as
o aspecto econômico: nitidamente a dependên­
cia do sistema produtivo desses países á tecnolo­
gia desenvolvida no exterior.
As atividades primário-exportadoras, predomi­
nantes no inicio da formação do sistema produti­
vo dos países em consideração, apresentavam
mínimas solicitações à inovação e á criatividade
interna de tecnologia. Em seguida, para ser breve
na análise, mas alertado para o salto no tempo, a
formação do parque industrial, mediante a im­
plantação do sistema de substituição dc impor­
tações, não só deixou dc suscitar estímulos ao
desenvolvimento tecnológico endógeno, como
representou um significativo desestimulo a essa
atividade.
Eis porque os paises cm desenvolvimento, adep­
tos dos instrumentos da substituição de impor­
tações, como forma mais viável c rápida de seu
crescimento econômico, lastreado no surgimento
c na fixação de uma indústria interna, devem
compreender a imprcscindibilidadc dc comple­
mentar essa política, com o esforço ordenado,
dinâmico c intenso do Estado, no sentido de for­
talecer o complexo científico-tecnológico. A esse
esforço somar-se-á o apoio do empresariado na­
cional.
Para tanto, pressupõe-se que seja formulada
uma política geral de desenvolvimento cientifico
c tecnológico adequada às solicitações do proces­
so produtivo e ao aprimoramento de qualidade metas sejam conhecidas, mas em que os mecanis­
de vida. mos de execução figurem claramente e represen-
tem apoio eficaz aos homens que deles irão
Considero mesmo aconselhável que na falta de servir-se.
uma política global devidamente explicitada, to­
me o Governo dos países em desenvolvimento a Quanto ao outro obstáculo citado, a fragilidade
iniciativa de formular uma política para os seto­ da infra-estrutura industrial e comercial, caracte- J
res científicos e técnicos dedicados à tecnologia rizantes dos países em desenvolvimento, res- i
da informação. Até porque, a conquista deste salte-se a importância da dependência da tec­
campo induzirá o avanço dos conhecimentos nologia da informação ao universo industriale
próprios a outros setores. comercial existente. Um país sem uma indústria
razoavelmente desenvolvida na área da mecânica (
Ademais, se um país em desenvolvimento incor­ fina, na de componentes eletrônicos, na de dis- j
pora o processo de substituição de importações positivos eletromecânicos, na de comunicações e
ao instrumental de incentivos à criação de uma com pouca experiência de comercialização inter- f
indústria de informática (insumos básicos de na e externa, para citar as limitações mais impor- !
grau eletrônico, componentes, equipamentos e tantes, enfrenta sem dúvida obstáculo não des- \
programas), tomou ele uma decisão política de prezível para a realização de sua autonomia nos ,
caráter claramente autonomista, a qual tem que campos considerados estratégicos da tecnologia j
ser acompanhada de medidas consistentes e in- da informação. j
centivadoras da criatividade científica e tec­
nológica nacional. Por isso mesmo, uma politica.de informática tem
que levar em conta essa realidade e buscar al­
cançar seus objetivos num esquema de priorida­
Agregue-se a esse empenho a orientação no senti­
do de que seja ativada a transferência de tecnolo­ des, estabelecido pela orientação governamental
para a indústria e para o esforço exportador do
gia exógena, em condições técnicas e financeiras
vantajosas ao empresário nacional. país. Ao tomar a decisão de que determinados
segmentos da tecnologia da informação devem
A substituição de importações na área dos equi­ estar sob controle nacional, os governos dos
pamentos, dispositivos e programas empregados países em desenvolvimento assumem o compro­
no processamento da informação e na sua difu­ misso político e social de viabilizar as indústnas
são (comunicações) dificilmente gerará, por si que fornecerão os produtos dessas tecnologias
só, tecnologias da informação, a exemplo do que As consequências dessa posição vital sobre os de­
sucedeu, na maioria das vezes, em outros setores mais setores industriais e atividades comerciais,
industriais. controlados por capitais nacionais e estrangeiros,
serão necessariamente avaliadas â luz da resposta
O Estado deve assumir a responsabilidade por que darão à oferta da indústria de informação
sua implantação, dinamização acelerada e pela nacional.
transferência de seus resultados, delegando go
empresário a função de escolher e utilizar em Com essa visão política e econômica do proble­
seus processos industriais as técnicas mais ma, cabe considerar os obstáculos que as compa­
aplicáveis ás condições do mercado. Tal postura nhias transnacionais podem representar para o I
vem sendo adotada em muitos países desenvolvi­ desenvolvimento tecnológico nacional. A litera­
dos, temerosos de se encontrarem, na corrida ele­ tura, os estudos e pesquisas existentes, produzi­
trônica, em posição desvantajosa em relação aos dos por iniciativa privada, oficial e pelos organis­
seus parceiros de afluência. mos internacionais, poderiam dispensar-me de
históricas pre­ abordar o tema, pelo receio de tornar-me repeti­
Ao empresário, nos paises cm desenvolvimento, tivo e nada imaginativo.
caberá, além desse aporte indispensável, a res­
ponsabilidade dc compreender a importância es­ Conquanto todos esses argumentos atendam,
tratégica das tecnologias da informação que eyentualmente, ao desejo deste importante au­
obtém do exterior ou dos centros e institutos na­ ditório, ouso falar sobre o assunto, movido pela
cionais. Essa compreensão coloca-o na obri­ convicção de que os governos da maioria dos
gação dc esforçar-se no sentido de ajustar e apri­ paises cm desenvolvimento não puderam, ou ma­
morar a tecnologia recebida, como forma não nifestaram pouco empenho em estabelecer regras
somente de fortalecer sua empresa, mas, princi­ de convivência entre o comportamento dessas
palmente, de participar dos custos sociais do de­ companhias e os interesses nacionais de seus po­
senvolvimento tecnológico informacional do vos.
pais.
Liberadas de obrigações que respeitem os objeti­
Na grande maioria dos países cm desenvolvimen­
vos nacionais, somente definíveis pelos próprios
to, a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico
países hospedeiros, as companhias transnacio­
ainda padecem de uma orientação extremamente
nais operam e operarão exclusivamente de acor­
influenciada pela tradição acadêmica, no que
do com os objetivos globais fixados além frontei­
respeita à ausência natural do espírito empresa­
ras. Nem sempre esses objetivos se coadunam
rial da atividade. Acredito que os núcleos de pes­
com as metas fixadas nos programas de desen­
quisa e desenvolvimento criados, ou já voltados
volvimento, ou explicitadas não programatica-
para a tecnologia da informação, necessitam
mente, pelos governos que lhes abriram as fron­
estruturar-se, organizar-se e submeter-se a um ti­
teiras.
po de gerência que busque dirigir seus trabalhos
com objetivos específicos, explicitados e estima­ ara que esse sistema de parceria produza os fru-
dos financeiramente em programas adaptados às )s esperados por ambas as partes, reconhece-se
grandes metas do progresso tecnológico, econô­ oje, universalmente, que os parceiros devem
mico e social do país. ncontrar-se em pé de igualdade.
Para que isso ocorra de forma permanente e crie ^sta igualdade, entretanto, vai resultar da identi- [
a compreensão de que não se pretende limitar a icação inicial das condições de desigualdade
livre especulação e a criatividade dos pesquisado­ m seguida, do estabelecimento, penoso t
res e técnicos, há necessidade da existência de ossivel, de critérios equitativos para o trata-
uma politica de informática, em que não só as lento de situações de natureza diversa. Se pre\a