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BILHETE  AO                                                                                                                                                                                   LEITOR






















                           “INTOCABILIDADE”  -  UM  SLOGAN  ABSURDO














                                                                                                                                                                                                                Hugo  P.  Suares














                                         Devido  aos  desencantos  e  decepções  sofridos  nos  muitos  anos  de  perseve­


                             rante  combate  à  tese  da  estatização  dos  serviços  públicos,  talvez  tenhamos


                             ficado  a  dever  os  momentos  de  reflexão  a  que  nos  impusemos,  recentemente,


                            buscando  em  leituras  amenas  reaquecer  o  espírito  e  readquirir  nõvo  alento


                             para  prosseguir  combatendo.


                                         Sinceramente,  o  chavão  surrado  da  intocabilidade  tão  em  moda  chega  a


                            magoar-nos,  mormente  quando  o  que  se  pretende,  na  maior  parte  dos  casos,


                             é  pura  e  simplesmente  conceder  a  determinadas                                                                                                                  criações  humanas  a  aura


                             da  infalibilidade,  quando  todos  sabemos  que  neste                                                                                                             mundo  nada,  a  não  ser  o


                             poder  divino,  o  pode  ser.


                                         Nada  nos  revolta  mais  e  desespera  do  que  a  assertiva,  quando  aplicada


                            indevidamente.  A  Petrobrás  intocável,  a  Constituição  intocável, e  tantos  e  tan­


                             tos  outros  chavões  de  intocabilidade,  chegam  a  enervar,  a  trazer  incontida  ir­


                            ritação,  porque  todos  sabemos  que  o  conceito  da  intocabilidade  nada  mais  re


                            presenta  que  a  conceituação  do  próprio  absurdo.


                                        Na  era  atômica,  quando  o  espaço  sideral  pretensamente  impenetrável  e


                            intocável  é  cortado  pelos  engenhos  do  homem;  quando  a  cirurgia  moderna


                            penetra  recantos  supostamente  inacessíveis  do  corpo  humano  para  corrigir


                            cs  males  e  restabelecer  a  saúde  —  comprovando  que  nem  mesmo  o  insondável


                            é  intocável  —  seria  ridículo  querer-se  assegurar  a  intocabilidade  de  preceitos


                           e  normas  engendrados  pelo  homem,  frutos  da  pura  alquimia  de  idéias  e  de


                            opiniões  muitas  vêzes  controversas.

                                        Tudo  isto  nos  vem  à  mente  diante  de  noticiário  mais  recente,  segundo  o


                            qual  a  estatização  dos  serviços  telefônicos  não  pode  mais  ser  impedido  por ser


                            uma  decorrência  da  Lei  n.°  4.117  e  porque  dita  lei  —  o  Código  Brasileiro  de


                           Telecomunicações  —  é  intocável!                                                                                           ,


                                        Mas  como  e  porquê  intocável  tal  lei,  se  a  própria  Lei  Maior, a  Constituição


                            Federai,  jamais,  em  tempo  algum,  o  tem  sido?  Porquê  considerarmos  a  infa­


                            libilidade  de  alguns  legisladores  que  caminharam  em  certa  fase  anormal  dêste


                            país,  para  a  estatização  radical  dos  serviços  de  telecomunicações,  se  está  pro­


                            vado,  seguramente  provado,  que  as  falhas  decorrentes  da  malsinada  lei  estão


                           a  exigir  correção?                                                                                                                                                                                                   »


                                        Na  leitura  amena  a  que  nos  referimos  fomos  buscar  o  lenitivo  para  os  nos­

                           sos  desenganes  —  nós  que  tanto  lutamos  por  um  ideal  superior,  o  do  revigo-


                           ramento  da  iniciativa  privada  nesse  campo  de  atividade  —  e  fomos  severa­


                           mente  batidos,  vencidos  pelos  extremistas  hoje  varridos  do  Congresso,  cujos


                           dogmas  ideológicos  nos  levaram  de  roldão  e  agora,  após  o  restabelecimento


                           dos  princípios  democráticos  e  da  ordem  jurídica  que  periclitaram,  somos  sur­


                           preendidos  com  a  mística  da  “intocabilidade"  da  Lei  4.117.                                                                                                                                              ,


                                        Só  mesmo  Thomas  Merton,  em  sua  edificante  e  magistral  obra  “Homem


                            algum  é  uma  ilha"  nos  poderia  dar  o  desejado  lenitivo,  fazendo  restabelecer


                            em  nosso  espírito  a  esperança  que  se  esvaía.


                                        Pedimos  vénia  aos  leitores  para  repetir  algo  que  nos  tocou  profundamente


                           em  nossa  leitura  e  demonstrar  que  nada  é  intocável  neste  planeta,  buscando


                           salientar  assim  que  o  princípio  da  intocabilidade  é  o  próprio  principio  do


                           absurdo  e  que,  por  essa  razão,  melhor  seria,  no  caso  em  tela  —  quando  se


                           discutem  as  falhas  do  Código  Brasileiro  de  Telecomunicações  melhor  seria


                           repetimos,  mudar  os  critérios,  alterar  as  fórmulas  legais  e  dar  à  lei  das  tele­


                           comunicações  as  linhas  adequadas  para  o  exercício  de  suas  próprias  regras.


                           Diz  o  magistral  pensador,  em  seu  magnífico  trabalho:                                                                                                                                                      ,
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