Page 5 - Telebrasil - Setembro/Outubro 1986

e d it o r ia l
R e c u l e r P o u r
M i e u x
A palestra realizada pelo vice-presidente da
E m bratel, Dr. Cleofas Uchôa, no X V Painel
TELEBRASIL, causou profundo impacto no setor
e ainda vem provocando debates.
Em breves palavras, a mencionada palestra,
que o autor chamou de ensaio, sugere que pode­
mos ter entrado em um beco sem saída de nosso
processo evolutivo e que — a exemplo do compor­
tamento da natureza nestes casos — devemos vol­
tar às nossas origens e escolher novos rumos de
evolução. Dar alguns passos atrás, voltar à boa
trilha da qual nos desviamos e retomar a marcha
do progresso. Dentro do provérbio francês: recuar
e, assim, melhor saltar os obstáculos.
Por que é que essas idéias foram tão entusiasti­
camente aplaudidas no momento de sua exposição
e continuam, agora, a inquietar os homens de tele­
comunicações do País? A resposta parece-me evi­
dente. Quase todos vivenciamos as duas fases por­
que passaram as telecomunicações brasileiras: a
dos bons tempos, que terminaram em 1979, e a de
penúria, da qual somente começamos a sair com o
advento da Nova República. E os bons tempos,
fundamentados em princípios e idéias, posterior­
mente tolhidos nos anos 80, ainda têm profundas
raízes nas memórias e nos corações dos pioneiros
do setor.
Afinal, qual seria o recuo necessário para reen­
contrarmos nosso caminho? Que mudanças, ocor­
ridas após 1979, nos levaram à presente situação
de dificuldade, a este "beco sem saída”, nas pala­
vras do Dr. Uchôa?
Em números, não foram m uitas, mas foram
profundas, fundamentais.
Em primeiro lugar, fomos abalados em nossas
bases económico-financeiras: os pilares do FNT,
do autofinandam ento e das tarifas ruíram par­
cialmente. O FNT deixou de nos pertencer, as
tarifas foram aviltadas, embora a Constituição
nos garanta o direito a uma remuneração justa, e
o autofinanciam ento afastou-se longamente de
valores realistas. Perdemos o indispensável oxigê­
nio para nosso crescimento.
Em segundo lugar, não bastando a exaustão de
recursos, fomos submetidos a uma incompreensí­
vel rigidez de controles, que pouco controlam e
S a u t e r
Gilberto Geraldo Garbi
(Presidente da Telepar)
Diretor da Telebrasil
muito inibem, cerceiam e amarram, a ponto de
termos vivido períodos em que fomos impedidos de
realizar obras, mesmo contando com recursos pró­
prios.
Finalmente, para nos restringirmos ao essen­
cial, fomos envolvidos por um clima psicológico —
gerado externamente — desmotivador de qual­
quer ação nas empresas estatais: acusações ge­
néricas de desperdícios, de "faraonismo” e de inefi­
ciência, propaladas por representante do próprio
Governo, e as constantes ameaças de desmoraliza­
ção pública através de auditorias de Tribunais de
Contas e de descabidos instrumentos como o Dis-
que-Corrupção.
É muito natural que o setor das telecomunica­
ções, enfraquecido financeiramente, tolhido em
suas realizações e envolvido por um clima em que
a situação mais segura para um administrador é a
de não realizar, tivesse vivido anos sucessivos de
desaceleração, que desaguaram na atual insufi­
ciência acumulada de mais de 2 milhões de linhas.
Para os que concordam com a bandeira levan­
tada pelo Dr. Uchôa, com o reculer pour mieux
sauter, deixo aqui minha visão sobre o caminho da
volta: reconstruir nossos fundamentos económico-
financeiros, através de preços realistas no autofi­
nanciamento e de tarifas justas nos serviços; re­
conquistar a autonomia de investimentos, dentro
de nossa capacidade própria, libertando-nos da ca­
misa de força que têm sido historicamente os nú­
meros da Sest; refazer nossa imagem pública, de
modo que todos os administradores sejam esti­
mulados a fazer cada vez mais, a realizar sem te­
mores, a ter confiança em que o Governo e a po­
pulação prestigiem o trabalho ativo e repudiem a
dormência acomodada.
Tudo isto é possível, se assim o quisermos, pro­
fissionais do setor, que já demonstramos no pas­
sado reconhecida capacidade de vencer os mais di­
fíceis obstáculos. Tudo isto é possível na medida
em que contarmos com o firme apoio do Governo.
A corajosa decisão do Ministro Antonio Carlos
Magalhães de rever os preços do autofinancia­
mento, nesta fase da economia brasileira, é uma
demonstração evidente de que estamos a caminho
de nossos melhores tempos.