Page 9 - Telebrasil - Janeiro/Fevereiro 1968
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A  T0LEI1ANCIA  PELA  INFLAÇÃO
                                                           O  Globo  —   Rio  —   27-13.67
                                                                      Eugênio  Gudin


            O  Brasil  é  um  país  (ou  uma  casa)  do   Em recente conferência pronunciada na
        muita  tolerância  pela  inflação.  Economis­  Confederação  do  Comércio,  disse  o  Profes­
        tas  desinfarmados  não  hesitam  por  vêzes   sor  Otá\io  Bulhões  com  a  experiência  hau­
        om  manifestar  sua  descrença  no  efeito  de­  rida  de  uma  lida  prolongada  o"m  a  hidra:
        letério  da  inflação  sôbre  o  desenvolvimen­  «Com  a  inflação  desapareceu  o  crédito
        to  econômico.  A  razão  é  simples,  é  que   público.  Impunha-se  seu  restabelecimento,
        êsse  efeit»  não  pode  sor  evidenciado  pelo   como  meio  dte  libertar  os  investimentos
        paralelismo,  ano  a  ano,  do  grau  de  inflação   governamentais  da  exigência  tributária.
        e  da  taxa  de  desenvolvimento.  Não  há   Com  a  inflação  foram  varridos  do  sis­
        proporcionalidade  ANUAL  entre  uma  coi­  tema  bancário  os  depósitos  a  prazo,  exce­
        sa  e  outra.  Isso  eu  já  dizia  em  trabalho   lente  fonte  de  barateamento  do  crédito  co­
        apresentado   à   International   Economic   mercial .
        Associaticm  em  1959  (Elsinor) .         Com.  a  inflação  foi  obstado  o  lança­
            A   pressão  inflacionária  em  determina-   mento  das  debêntures,  magnífico  meio  de
        nado  ano  não  se  faz  sentir  necessariamen­  captação  de  recursos,  cm  complemento  ao
        te  sôbre  a  taxa  de  desenvolvimento  dêsse   capital  acionário.
        mesmo  ano;  pode  o  efeito  ter  sido  até  fa­  Sob  o  impacto  inflacionário,  ninguém
        vorável,  se  havia  fatores  de  produção  não   se  aventura  a  comprar  títulos  de  renda
        aproveitados.                          fixa,  nem  a  fazer  depósitos  a  prazo.  O  ca­
            A   inflação  do  ano  1  vai  repercutir  no   pital  emprestado  ou  depositado  é  corroido
        desenvolvimento  econômico  dos  anos  3,  4,   pela  acão  inflacionária».
        5  ou  mais.  As  recessões  que  tivemos  de   «O  Governo,  a.o  assumir  o  poder,  em
         enfrentar  em  princípios  de  1965  e  fins  de   abril  de  1964,  encontrou  o  País  com  enor­
        1966,  e  que  contribuiram  para  a  queda  da   me  deficiência  de  energia  elétrica,  de  telefo­
         taxa  de  desenvolvimento  nesses  dois  anos,   nes;  perigosa  escassez  de  residências;  alar­
        são  debitáveis  aos  Kubitcheks  e  aos  Gou-   mante  insuficiência  de  produção  agrope­
         larts,  que  fizeram  a  inflação  de  1957  a   cuária.  Eram  os  setores  da  atividade  eco­
         1964.  Não  há  portanto  como  procurar  cor­  nômica  que  vinham  sofrendo  os  deletérios
         relações  «de  ano  a  ano»,  ou  de  um  ano  pa­  efeitos   da   INFLAÇAO   REPRESADA.
         ra  outro.                            Amedrontados  os  govêrnos  anteriores  Om
            Isso  explica  como  um  economista  do   cg  efeitès  de  uma  inflação  que  não  tinham
         valor  do  professor  Delfim  Neto  pode  ter  di­  i\.  coragem  de  eliminar,  julgaram  preferí,
         to  que                               vel  CORRIGIR  OS  EFEITOS  EM  VEZ
            «Na  verdade,  entretanto,  o  estudo  da   DE  ATACAR  AS  CAUSAS.  Determina­
         história  econômica  oferece  os  exemplos   ram  o  congelamento  dos  preços  da  energia
         mais  contraditórios  de  estagnação,  com   elétrica,  dos  aluguéis  e  de  alguns  produ­
         ou  sc-m  inllação,  de  inflação  com  ou  sem   tos  da  agricultura  e  da  pecuária,  Em  re­
         desenvolvimento».                     sultado  dêsse  procedimento,  havia  em
                                               1964,  racionamento  de  energia  elétrica;  fa-
            Outro  elemento  que  contribui  podero­  ziam-se  filas  intermináveis  para  a  aquisi­
         samente  para  estabelecer  a  confusão  é  co­  ção  de  produtos  agropecuários  e  a  habita­
         mo  diz  o  ilustre  economista  Rómulo  Fer-   ção  achava-se  em  contraditória crise:  enor­
         rero,  que                            me  procura  de  residências,  a  par  de  com­
            «Podem-se  mostrar  as  obras  construí­  pleto  desestimulo  à  construção».
         das  em  uma  política  de  inflação  mas  não   Essa  escassez  de  energia  elétrica,  de
         se  podem  mostrar  as  que  deixaram  de  ser   telefones,  de  residências,  de  produtos  da
         feitas  por  i>ua  forçosa  redução  em  outros   Agricultura  e  da  Pecuária,  bem  como  as
         campos»                               distorções  dos  investimentos,  de  taxas  do
         e  também  que,                       juros,  etc.,  a  que  Bulhões  se  refere,  resul­
            «Quando  se  diz  que  a  inflação  retar­  tam  da  inflação  de  Kubitseheek  e  Goulart
         da  o  desenvolvimento  ccnnômico,  não  se   PRATICADA  ANOS  ATRAS.  NAO  SAO
         quer  dizer  que  o  anula.  Um  país  que  so­  EXPLICÁVEIS  A  BASE  DE  ANO  PARA
         fre  um  pdtecesso  de  infjiçáo  não  deixa   ANO.
         por  isso  de  se  desenvolver  MAS  FÃ.LÒ   Daí  as  deformações  ópt-cas  de  que  são
         A  UM  RíTMO  MAIS  LENTO  E  A  UM   vítimas  os  observadores  menos  avisados.
         CUSTO  mais  elevado  e  corti  maiores  sa-   Os  males  (pie  disso  podem  advir  para  o
         crifícirb  do  que  outro  país  em  que  não   país  são  por  demais  séries  para  que  não
         se  segue  tal  política».            se  dê,  em  tempo  útil,  o  sinal  de  alarma.
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